terça-feira, 17 de março de 2015

Peixe de vida curta ajuda em pesquisas contra o envelhecimento


O peixe-anual (ou peixe-nuvem) turquesa vive num mundo passageiro: os lagos que aparecem apenas durante a estação chuvosa do oeste da África.
Quando novos lagos se formam, os ovos do peixe-anual enterrados na lama acordam da sua animação suspensa. Eclodem e, em apenas 40 dias, os peixes crescem até ao tamanho normal, cerca de 6,5 centímetros. Os peixes alimentam-se, cruzam-se e depositam ovos. Quando o lago seca, morrem.
Mesmo quando as pessoas os «mimam» em aquários, os peixes-anuais turquesa sobrevivem apenas alguns meses, colocando-os entre os vertebrados com menor tempo de vida. Por isso estes peixes não parecem os melhores animais para se estudar quando a ideia é descobrir os segredos de uma vida longa.
No entanto, investigadores estão a descobrir que estes peixinhos envelhecem de maneira parecida com a nossa, apenas muito mais rapidamente. «É um tempo de vida comprimido», explica Itamar Harel, pesquisador pós-graduado da Universidade Stanford. Recentemente, Harel e os seus colegas desenvolveram um conjunto de ferramentas para investigar a biologia do peixe-anual turquesa.
As pessoas mais velhas parecem um foco mais lógico para os cientistas que procuram descobrir os mecanismos do envelhecimento, mas o progresso pode ser lento.
«Quem é que tem 70 anos para estudar o processo de envelhecimento de alguém?», pergunta Sarah J. Mitchell, pesquisadora e pós-doutorada do Instituto Nacional de Envelhecimento.
Em vez disso, os cientistas procuraram os segredos do envelhecimento em vários modelos de animais. Mas nenhum imitava perfeitamente o que acontece com os humanos.
Sarah estuda ratos, que vivem de três a quatro anos. Usando os animais, aprendeu como os genes se tornam mais ou menos activos com a idade e conseguiu testar várias drogas que os fizeram viver mais. No ano passado, ela e os seus colegas mostraram que um composto chamado SRT1720 aumenta o tempo de vida dos ratos em 8,8% em média, ao mesmo tempo que melhora a saúde dos animais.
Mas, mesmo os ratos, que vivem pouco, podem atrasar a pesquisa sobre o envelhecimento. Assim, alguns investigadores focaram-se num pequeno verme nematoide chamado Carnorhabditis elegans, que alcança uma idade avançada em poucas semanas. Os cientistas descobriram que genes que influenciam o seu processo de envelhecimento também funcionam em humanos.
Em 2004, quando Anne Brunet chegou à Universidade Stanford como professora assistente de genética, começou a estudar ratos e vermes. Mas achou que alguma coisa estava a faltar. Apesar de os vermes crescerem rapidamente, não podiam responder a algumas das suas mais importantes perguntas sobre a idade. Uma delas, por exemplo, é que, como não têm esqueleto, não há como aprender por que é que os ossos ficam mais frágeis.
Então, um aluno da universidade falou-lhe sobre o peixe-anual turquesa. Depois de a espécie ter sido descoberta em 1968, os cientistas encontraram muitos paralelos entre a sua maneira de envelhecer e a dos humanos.
Peixes-anuais velhos perdem massa muscular, como nós. As fêmeas param de produzir ovos férteis. O sistema imunológico titubeia. A sua capacidade de aprender coisas novas também diminui no final da vida.
Em 2006, Anne começou a constituir uma equipa de pesquisadores de pós-doutoramento e alunos para estudar o peixe-anual turquesa em mais detalhe. Porém uma série de problemas atrasou a pesquisa por anos.
Uma infecção por parasitas matou todos os peixes que tinham, por exemplo; depois de uma limpeza completa do laboratório, os cientistas tiveram que começar do nada.
Assim que os pesquisadores descobriram como manter os animais felizes, a equipa de Anne focou-se no trabalho científico; sequenciaram todo o genoma do peixe-anual turquesa, identificando vários genes conhecidos por influenciar o processo de envelhecimento noutras espécies, incluindo ratos e humanos.
Então Harel construiu as ferramentas moleculares que a equipa utilizou para mexer com os genes dos peixes. Usando uma nova técnica chamada Crisps, criou tesouras moleculares que conseguem recortar qualquer pedaço do ADN do peixe-anual e trocar por outro.
Para testar essas ferramentas, Harel e os seus colegas estudaram um gene chamado TERT, que protege o ADN para que não se desgaste e rasgue. Este codifica uma proteína que ajuda a construir uma cobertura, chamada telómero, no final das moléculas de ADN.
Como pontas plásticas no final de cadarços, os telómeros não deixam que o ADN desfie. Quando as células se dividem, os seus telómeros ficam mais curtos, e essa mudança provavelmente tem um papel no processo de envelhecimento, mas como isso acontece ainda é um mistério.
Harel e os seus colegas tiveram sucesso em alterar o gene TERT para que o peixe não produzisse mais a proteína. Os animais transformados desenvolveram embriões normalmente, mas, quando adultos, sofreram com uma série de defeitos.
Os machos tornaram-se quase que totalmente inférteis, enquanto que as fêmeas produziram uma quantidade menor de ovos. As paredes dos seus intestinos atrofiaram, e eles fizeram menos tipos de células do sangue.
Esses resultados intrigaram os pesquisadores. De um lado, as mudanças observadas nos peixes eram parecidas com algumas que os humanos passam ao envelhecer. Mas os peixes não morreram mais rapidamente do que aqueles que tinham os genes TERT a funcionar.
Anne ficou entusiasmada por conseguir este tipo de resultado tão rapidamente. «É um daqueles momentos marcantes na ciência», afirma. No mês passado, Anne os e seus colegas publicaram as descobertas no jornal Cell.
Anne tem planos de fazer experiências com genes de peixe-anual turquesa envolvidos no envelhecimento de outras espécies e depois procurar por genes importantes no processo que podem ter sido ignorados em animais de vida mais longa.
Os pesquisadores também esperam testar tratamentos anti-envelhecimento nos peixes. Mesmo uma droga que proporciona duas semanas extra de vida pode mostrar o caminho para um composto que aumente a vida dos humanos em anos.
«Espero que abra as portas para o nosso laboratório e para outros», diz Anne.

Fonte: Diário Digital

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