Considerado um dos fenómenos que mais afectam os oceanos actualmente, a acidificação oceânica só foi mencionada pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) no seu quinto relatório de avaliação (AR5), publicado em 2013 – o primeiro relatório é de 1990.
O órgão da ONU destaca no Sumário para formuladores de políticas públicas do AR5 que o oceano tem absorvido cerca de 30% do dióxido do carbono atmosférico (CO2) emitido pela acção humana.
O aumento da concentração e da dissolução de CO2 tem diminuído o pH da água superficial dos oceanos desde o início da era industrial e aumentado a sua acidez, afirmaram os autores do relatório. A partir de então, a acidificação dos oceanos passou a integrar todos os cenários de mudanças futuras do clima do AR.
O tema deve ganhar ainda mais destaque no AR6 – previsto para ser finalizado em 2021 – e no Relatório Especial sobre o Oceano e a Criosfera num Cenário de Mudanças Climáticas, que deve ser finalizado pelo IPCC em Setembro de 2019, estimou Jake Rice, membro do grupo de especialistas da Avaliação Mundial dos Oceanos da ONU.
Especialista em ecologia e biologia marinha, conselheiro e cientista-chefe do Departamento de Pesca e Oceanos do Canadá, Rice é um dos investigadores convidados da São Paulo School of Advanced Science on Ocean Interdisciplinary Research and Governance. O evento, realizado pelo Instituto Oceanográfico da Universidade de São Paulo (IO-USP), com apoio da FAPESP, ocorre até 25 de Agosto no Instituto de Estudos Avançados (IEA) da USP.
“Há uma confiança muito alta de que a acidificação dos oceanos tem aumentado e têm sido bastante documentado os efeitos desse fenómeno em organismos marinhos que dependem de carbonato de cálcio para os seus processos de calcificação”, disse Rice.
“As séries temporais de observação dos oceanos, que permitiriam estimar a taxa e a trajectória desse fenómeno ao longo das últimas décadas, contudo, são muito curtas. As de acidez oceânica em águas costeiras, por exemplo, datam de pouco antes de 2005”, disse.
De acordo com o investigador, os modelos de sistemas terrestres projectam um aumento global na acidificação e diminuição no pH oceânico em todos os cenários de emissão e concentração de gases de efeito estufa, mas com grandes e incertas variações regionais e locais.
Os países em desenvolvimento e as pequenas ilhas dos trópicos, que dependem de recursos marinhos, serão os mais afectados directamente ou indirectamente pelo fenómeno.
Os impactos negativos da acidificação oceânica devem variar de mudanças na fisiologia e comportamento dos organismos (como moluscos) e na dinâmica populacional que afectarão os ecossistemas marinhos (como os recifes de corais), durante séculos se as emissões de CO2 continuarem no ritmo actual. Mas há uma série de outros impactos, muitos dos quais ainda não compreendidos, ponderou Rice.
“A acidificação dos oceanos ilustra vários dos desafios que temos enfrentado na ciência do oceano. É preciso mais dados que nos permitam estabelecer relações entre as propriedades físicas de sistemas dinâmicos, com impactos biológicos nos ecossistemas e na sociedade”, afirmou.
Na opinião do canadiano, um dos factores que tornam mais difícil fazer ciência dos oceanos em comparação com as ciências da terra é a maior facilidade em entender a dinâmica terrestre porque vivemos em terra. Dessa forma, é possível ver e analisar directamente como o sistema terrestre funciona.
“A nossa compreensão do oceano precisa prestar mais atenção às evidências e menos à percepção de que é possível entendê-lo por analogia ou inferência do conhecimento sobre a terra e os seus sistemas biofísicos”, disse Rice.
Fonte: Exame
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