quarta-feira, 19 de abril de 2023

Vento pode ser decisivo para ajudar navios a poupar combustível


Novos modelos de velas e barcos foram concebidos para ajudar os proprietários de navios a reduzir os custos de combustível e as emissões.

Não há como negar o entusiasmo - e competência - de Cristina Aleixendri quando se trata de falar sobre como o regresso da navegação assistida pelo vento está prestes a mudar o planeta. Em 2014, Aleixendri fundou uma empresa chamada bound4blue com dois colegas espanhóis para desenvolver uma tecnologia de navegação inspirada na sua formação em engenharia aeronáutica.

"Quando começámos, éramos vistos como engenheiros malucos por querermos trazer as velas de volta aos navios", afirmou. "Mas quando falamos com armadores actualmente, dizem-nos que iremos voltar ao vento e que nunca mais o vamos deixar".

É fácil de compreender porquê. A indústria naval é responsável por cerca de 3 % das emissões globais de gases com efeito de estufa e está a tentar afastar-se do fuelóleo pesado, que é altamente poluente.

"A tecnologia de propulsão eólica tornar-se-á um padrão", afirmou Aleixendri. "Começou como um sonho meu. Agora, vejo-o menos como um sonho e mais como uma realidade".

Não só a bound4blue, sediada em Barcelona, atraiu um interesse crescente das empresas de navegação no seu sistema de propulsão assistida pelo vento, como Aleixendri alcançou um reconhecimento pessoal significativo pelos seus esforços. Em 2019, fez parte da lista Forbes 30 Under 30 no fabrico e indústria na Europa. No ano seguinte, Aleixendri ganhou o Woman Award do Instituto Europeu de Inovação e Tecnologia, que reconhece mulheres empreendedoras inspiradoras.

Actualmente, a bound4blue está a coordenar um projecto de velas financiado pela UE, que tem o mesmo nome da empresa, e que decorrerá durante dois anos, até fevereiro de 2024. Existe um grande espaço para o crescimento da navegação assistida pelo vento.

Em setembro de 2022, apenas 21 grandes navios comerciais a nível mundial estavam equipados com a capacidade de aproveitar a energia eólica, de acordo com a International Windship Association. Embora esteja previsto que existam mais do dobro este ano, até 50 navios, é ainda uma gota no oceano em comparação com a frota global.

De acordo com Aleixendri, a energia eólica é viável para uma variedade de navios, incluindo cargueiros, petroleiros, ferries e navios de cruzeiro.

"Trata-se de um mercado enorme porque existem mais de 60 mil navios a navegar em todo o mundo que poderiam beneficiar de tais soluções", afirmou. "Isto é muito incipiente". Com o início de 2023, a entrada em vigor da nova regulamentação da Organização Marítima Internacional sobre eficiência energética e emissões de carbono deverá também estimular o crescimento.

"Penso que é o momento certo para investir na propulsão eólica - é uma óptima altura para nós", afirmou Aleixendri, que é a directora-geral administrativa da sua empresa e mestre em ciências de engenharia aeroespacial pela Universidade Politécnica da Catalunha.

A bound4blue desenvolveu o que se chama uma vela de sucção autónoma, que não se parece nada com uma vela tradicional. Tem a aparência de uma torre em forma de cilindro que se eleva do convés do navio.

As velas tradicionais funcionam ao "apanhar o vento". O vento cria uma área de maior pressão atrás da vela, em comparação com o seu outro lado. Esta diferença de pressão gera uma força que impulsiona o navio para a frente, conhecida como "força de sustentação".

Por outro lado, o "eSAIL" da bound4blue contém um ventilador de sucção para atrair o ar para dentro da torre à medida que o vento sopra à sua volta, criando uma força de sustentação mais forte para impulsionar o barco.

De acordo com Aleixendri, o resultado é seis ou sete vezes mais do que a força de sustentação de uma vela rígida convencional e poderia reduzir o consumo de combustível até 40 %, se combinado com uma melhor concepção do navio e ajustes nas rotas para tirar partido dos ventos predominantes. O eSAIL é mais adequado para as condições de vento encontradas no Atlântico Norte e no Pacífico Norte, afirmou - embora a sua utilização não seja de modo algum exclusiva dessas rotas.

A redução de emissões irá variar, dependendo das condições gerais de vento em diferentes rotas. Por exemplo, a bound4blue estima que um navio mercante que navegue os 25 mil quilómetros do sul do Brasil até ao nordeste da China poderia poupar 26 % em combustível e emissões.

Embora ainda seja cedo, alguns primeiros carregadores já relataram uma poupança de 15 %. A bound4blue assinou também uma série de acordos com empresas de navegação, incluindo a japonesa Marubeni e a francesa Louis Dreyfus Armateurs.

"Actualmente, temos mais procura do que o que podemos fornecer, por isso estamos muito satisfeitos com a forma como está a correr", disse Aleixendri.

Embora a nova tecnologia tenha sido anteriormente considerada arriscada de instalar em navios, as opções assistidas pelo vento, como as da bound4blue, começam a fazer sentido do ponto de vista económico e podem pagar-se a si próprias através da poupança de combustível, no prazo de cinco anos, afirmou.

"No final, a propulsão eólica está a oferecer energia gratuita e renovável cujo fornecimento não depende do armazenamento ou investimento em infraestruturas", disse Aleixendri.

Perante a promessa de opções baseadas no vento, surge um desafio: assegurar a sua implementação adequada para atingir todo o seu potencial de desempenho ou evitar efeitos indirectos negativos no funcionamento do navio. Assim, outro projecto financiado pela UE, OPTIWISE, está a investigar como a concepção geral dos navios pode ser ajustada para optimizar a propulsão assistida pelo vento.

Uma melhor adequação dos navios à tecnologia pode ajudar a melhorar a eficiência da navegação e a redução de emissões, segundo Rogier Eggers, que lidera o projecto de três anos, a decorrer até maio de 2025.

As alterações na concepção podem também ajudar a superar algumas das potenciais consequências negativas da instalação de velas em navios. Tal pode, por exemplo, criar um obstáculo à passagem sob objectos como gruas nos portos ou mesmo afectar os navios de tal forma que estes tenham dificuldade em manter-se no rumo.

"Isso simplesmente não é aceitável, pelo que é necessário observar a forma do casco e os apêndices, como os lemes, para garantir o equilíbrio do navio", afirmou Eggers, um gestor de projectos sénior do instituto holandês de investigação marítima MARIN.

Nos próximos anos, o projeto OPTIWISE planeia utilizar modelos à escala de navios de vários metros de comprimento para testar os sistemas eólicos e os efeitos das melhorias tecnológicas em várias condições do mar. O projecto pretende também empregar simulações de viagens baseadas em computador e aprendizagem automática.

De acordo com Eggers, as inovações poderiam proporcionar reduções da ordem dos 30 % nas emissões de carbono, talvez chegando mesmo a atingir os 50 %, se entregues de modo eficaz.

Se as tecnologias eólicas puderem ser integradas com sucesso, métodos como velas de sucção, velas-asa e velas cilíndricas de rotor giratório, a serem produzidas por parceiros do OPTIWISE, poderiam ganhar muita força, afirmou.

A adopção de tais velas de rotor permitiria o ressurgimento de uma tecnologia baseada no vento, inventada há um século por Anton Flettner, um engenheiro alemão. Em consequência da crescente popularidade do gasóleo na altura, esta tecnologia foi pouco adoptada.

"Vários fornecedores têm sido bastante activos com a tecnologia eólica e têm recebido um interesse crescente do mercado naval por instalações", afirmou Eggers. "Antes, existia uma grande relutância em colocar tais opções nos navios, mas dispositivos como rotores Flettner, velas de sucção e velas-asa estão gradualmente a ganhar a confiança da indústria".

Esta transição promete colocar o sector marítimo num caminho de redução das emissões.

"Estamos no início no que toca a levar a navegação a um futuro sem emissões", disse Eggers. "Actualmente, o número de navios equipados com propulsão eólica é ainda reduzido em comparação com a frota mundial, mas a esperança é de que, em breve, veremos centenas de navios por ano a serem equipados".

Fonte: JN

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