segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Há 100 anos o porto do Funchal abriu a cidade ao mar



Até 1840, o Funchal foi uma cidade muralhada, voltada para dentro, que só se abriu ao mar com a construção do porto, um projecto que surgiu com grande atraso devido à "má vontade" do Estado.
Esta é a opinião do historiador Alberto Vieira, para quem a construção desta infraestrutura no Funchal foi sempre uma "reivindicação dos madeirenses", numa cidade por onde passou o comércio do açúcar, do vinho e depois foi 'descoberta' como pólo turístico.
Mas a realização da obra esbarrou na "atitude quase que austera" do Estado português, lembrou Alberto Vieira, que falava à agência Lusa a propósito do primeiro centenário da concretização deste 'sonho' da população da ilha, um projecto desencadeado a 13 de Agosto de 1913, sob a responsabilidade da Junta Autónoma das Obras do Porto do Funchal.
O investigador destacou a transformação que o porto operou na cidade, recordando que "até 1840, o Funchal era uma virada para dentro, com uma muralha (...) existia o espaço urbano, o espaço rural e o calhau [beira-mar], que era um outro mundo".
"A partir de meados do século XIX a cidade abre-se totalmente ao mar", tendo o porto como o seu principal atractivo, de tal modo que "Raul Brandão e outros diziam que 'quando chegava o vapor a cidade ganhava vida, quando eles partiam a cidade parecia que adormecia'".
O historiador salientou ainda que "desde o início se falava da necessidade de construir um molhe para abrigar os barcos" devido às características peculiares da baía do Funchal, onde desaguam quatro ribeiras. O local era também afectado pela forte ondulação e vento o que, em várias épocas do ano, causou vários naufrágios.
O porto foi surgindo em várias fases, tendo sido feita uma "primeira tentativa de ligação da costa ao ilhéu da Pontinha, que não resulta. Depois, a segunda fase, é a ligação entre os dois ilhéus", mas "só mais tarde (...) se avança com projecto de alargamento que vai dar origem ao porto artificial que é inaugurado em 1962", explicou.
O historiador considerou que "este porto começa primeiro por uma situação anedótica (...), uma situação inédita em termos de obras portuárias", o que é "um caso paradigmático porque o Funchal é o terceiro porto do país (...), dá lucros elevados ao Estado e era natural que houvesse investimento".
Mas o Estado, segundo Alberto Vieira, ao contrário da postura que adoptou em relação a outros portos que surgiram no país (Leixões, Horta e Ponta Delgada), em que se prontificou a suportar a construção, relativamente ao projecto do Funchal decidiu abrir um concurso para "uma concessão por 50 anos a uma firma estrangeira [inglesa]", o que gerou uma forte contestação e acabou por ser anulado, relatou.
Alberto Vieira referiu ainda que as obras começaram em 1913, mas "parece que se alimentou um conflito quase permanente entre vários projectos, varias
possibilidades de construção no sentido de se adiar permanente a sua construção".
Por isso, considerou que "em 1962, quando são inauguradas as obras do porto do Funchal, quando ele está pronto a receber navios, já se está no auge da navegação aérea", pelo que este se torna "um investimento que vem atrasado no tempo e não vai cumprir na sua plenitude a sua missão".
Alberto Vieira conclui que o porto do Funchal é "um projeto eternamente adiado".
"Um projecto que os madeirenses sonham ver crescer"
O porto do Funchal foi sempre um projecto "mal-amado" pelo Estado, mas hoje tem "dignidade e dimensão", embora os madeirenses continuem a sonhar com o seu prolongamento, afirmou a presidente da Administração dos Portos da Madeira (APRAM).
Numa altura em que APRAM comemora o primeiro centenário da Junta Autónoma das Obras do Porto do Funchal, entidade responsável pelo projecto de construção da infraestrutura portuária da capital madeirense, Alexandra Mendonça salientou que, em 2012, o porto do Funchal foi "o maior a nível nacional [em termos] de passageiros e escalas", tendo registado a passagem de cerca de 600 mil passageiros e 339 navios.
E esta infraestrutura é a "terceira a nível mundial" nos inquéritos de satisfação, pois alcançou a "maior pontuação de 0 a 10" dos visitantes, o que evidencia que é "apetecível", realçou.
"O porto do Funchal hoje é uma realidade. Efectivamente, ao longo da história foi um projecto mal-amado, tanto que foi dos últimos a serem feitos (...), mas hoje é um porto com dignidade, dimensão", referiu a responsável sobre aquela que durante séculos foi "a única porta de entrada e saída" da ilha tanto de pessoas como de mercadorias.
Hoje, o porto está vocacionado apenas para o turismo, e "o seu futuro é complexo", notou. Segundo Alexandra Mendonça, "o porto do Funchal ao longo destes últimos
dez anos cresceu com margens muito grandes, mas isso não quer dizer que nos próximos dois anos continuem a ser as mesmas", pelo que 2013 "será mais de consolidação", estimou.
A presidente da APRAM disse que a infraestrutura portuária do Funchal enfrenta várias "condicionantes", sendo afectada pelo problema do aumento do preço do combustível, o facto de estar numa "zona mais complicada" no Atlântico em relação aos circuitos atlânticos, a aposta que as companhias estão a fazer no mercado asiático e os turistas procurarem "coisas diferentes".
Por isso, o Funchal será sempre um porto de "consolidação, de excelência, uma porta de entrada" que tem de ser gerida da melhor forma", opinou.
"Podemos querer sempre mais e melhor, mas hoje o Funchal é um porto com dignidade, nomeadamente por causa da nova gare que é do ponto de vista arquitectónico e operacional uma mais-valia em termos de segurança para a Madeira e a cidade", declarou a administradora.
Quanto ao futuro, Alexandra Mendonça defendeu que "seria excelente pensar em aumentar o porto, até porque os navios são cada vez maiores", mencionando que antes era possível a atracagem de três navios em simultâneo, mas os barcos são agora de grandes dimensões e os que estão a ser construídos são ainda maiores, podendo, por vezes, o porto receber apenas um.
O Funchal tem um outro terminal, na zona sul, e passará a dispor brevemente de um cais de cruzeiros com 330 metros, mais próximo do centro da cidade, e pode tornar-se num pólo de atracção para os mega iates, o que considera ser "um mercado apetecível".
"Daqui a cem anos, acredito que o porto do Funchal ainda será mais bonito, a frente mar será mais bonita, teremos o aumento que todos os madeirenses desejam e que seria a solução ideal em termos de atracação de navios", visualizou. Alexandra Mendonça concluiu: "daqui a cem anos o porto do Funchal será uma realidade ainda mais bonita e apetecível do que foi há cem anos".
Fonte: DN

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