sábado, 25 de março de 2017

"Engavetámos o mar por causa de um trauma"


O presidente-executivo da Fundação Oceano Azul diz que Portugal pode afirmar-se como grande potência marítima.

Foi o mar que fez o pequeno rectângulo chamado Portugal agigantar-se, é ele que, mais uma vez, nos pode devolver a auto-estima e acabar com um atraso de pelo menos dois séculos. Não é coisa pouca, não senhor. Mas o autor do ensaio Portugal e o Mar, e um dos maiores especialistas nacionais em ciência, mar e ambiente, Tiago Pitta e Cunha, acredita que isso vai acontecer. Anda a congeminar como fazê-lo há quase três décadas e vê na inauguração da Fundação Oceano Azul, da Sociedade Francisco Manuel dos Santos (SFMS), da qual é presidente-executivo, um passo gigante nesse sentido. Explica ao que vem esta instituição com curadores de todo o mundo, e como um país pequeno pode ousar afirmar-se como grande potência marítima.

Em que medida é que a Fundação Oceano Azul (FOA) pode ajudar Portugal a mudar o seu "trágico" destino?
A principal marca distintiva de Portugal é a geografia e a principal marca distintiva da geografia portuguesa é o mar. Durante décadas, este elemento que deve ser preponderante na política do país passou despercebido e o tema dominante foi a integração europeia e a ligação a Bruxelas. Esse traço distintivo tem um potencial que não conhecíamos.

A dedicação exclusiva à Europa, e o facto de, nesse contexto, pouco nos distinguirmos dos outros, fez-nos reconciliar com o mar?
Compreende-se o desaparecimento do mar das prioridades nacionais. A ligação do País às colónias ultramarinas foi o grande desígnio do Estado Novo, sobretudo a partir das guerras coloniais. Quando, em Abril de 1974, há um virar brusco de página, o mar torna-se parte do passado e é engavetado, também devido ao trauma. Entretanto, houve uma revolução profunda, Portugal passou de País voltado para o sector primário para um País dedicado ao sector terciário.


A própria Europa normalizou-nos. O desígnio marítimo foi de algum modo trocado por fundos comunitários.
Isso é um dos grandes mitos urbanos da actualidade e que nasce de um complexo de menoridade nosso inacreditável. A Irlanda, que nunca teve frota de pesca, quando entrou na CEE tornou-se num dos grandes países europeus nessa matéria. Ninguém nos disse: "Os senhores agora vão parar de pescar." Fomos nós que quisemos fazê-lo. A pesca era uma actividade de subsistência e quisemos migrar para os serviços. Quando nos afastámos do mar foi como se estivéssemos a acabar com 500 anos de solidão – os 500 anos de navegação foram também de solidão.


Fonte: Sábado 

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