Cerca de 80% do território ocupado pelo tubarão-azul e pelo tubarão-anequim no Atlântico Norte sobrepõe-se à rota das frotas pesqueiras portuguesa e espanhola, conclui estudo que inclui cientistas portugueses e que defende quotas de pesca para as duas espécies.
Todos
os anos, dez milhões de tubarões são pescados nos oceanos. As
vulgares linhas de pesca dos navios, com os seus 100 quilómetros de
comprimento, facilmente capturam mais de cem indivíduos da espécie
tubarão-azul (Prionace glauca) em apenas um dia.
Tanto esta espécie como o tubarão-anequim (Isurus
oxyrinchus) têm sido alvos das frotas pesqueiras, já que
não há quotas para a sua pesca.
Preocupada
com o estado de conservação destes tubarões, uma equipa
internacional de cientistas foi investigar a sua vulnerabilidade.
Para isso, analisou a sobreposição espacial e temporal de 99
tubarões, monitorizados com equipamentos electrónicos, e as frotas
pesqueiras de Portugal e de Espanha, no oceano Atlântico. “Os
nossos resultados indicam que os pescadores estão presentes em
habitats-chave dos tubarões durante uma boa parte do ano, o que
levanta questões sobre o futuro da sua sustentabilidade”, lê-se
no artigo publicado na revista norte-americana Proceedings
of the National Academy of Sciences,
assinado por investigadores de Portugal, de Espanha, do Reino Unido e
dos EUA.
“Provavelmente,
a melhor medida para proteger as duas espécies de tubarões seria a
introdução de quotas de pesca”, diz Nuno Queiroz ao PÚBLICO. O
investigador, do Centro de Investigação em Biodiversidade e
Recursos Genéticos (Cibio), no Porto, é um dos autores do trabalho.
A
situação destas duas espécies de tubarões é diferente da do atum
(espécies do género Thunnus)
ou do espadarte (Xiphias
gladius),
que têm quotas de pesca. O espadarte, inclusivamente, só pode ser
comercializado a partir de um certo tamanho. “Os pescadores podem
apanhar os tubarões que quiserem. A única condição é que, quando
desembarcam, as barbatanas têm de vir agarradas aos tubarões”,
explica o investigador português.
As
barbatanas são as partes mais caras dos tubarões. Esta medida foi
introduzida para evitar que os navios de pesca pescassem os tubarões,
lhes cortassem as barbatanas e atirassem o resto do corpo para o mar.
Isto permitia trazer muito mais barbatanas — já que os navios de
pesca não tinham de carregar os corpos dos animais, que no caso dos
tubarões-azuis podem atingir os três metros de comprimento — e,
por isso, permitia pescar muitos mais tubarões.
Ainda
assim, não havendo quotas para aquelas duas espécies, os navios
podem pescar o número de tubarões que quiserem. Segundo Nuno
Queiroz, o Índico é o oceano onde a pesca ao tubarão é mais
intensa, a seguir é o Atlântico e por fim é o Pacífico, que, como
é maior, o esforço de pesca por quilómetro quadrado acaba por ser
inferior.
“As
análises mostram que o risco de extinção dos tubarões e das raias
é maior do que para a maioria dos outros vertebrados”, lê-se no
artigo, no qual se argumenta que é necessário uma melhor gestão
destas espécies para as conservar. O problema, segundo os autores, é
que há pouca informação sobre a vulnerabilidade dos tubarões à
pesca. Uma característica destes animais que aumenta as incertezas
sobre este aspecto é o facto de serem migradores.
Por
isso, os cientistas seguiram por satélite o movimento de 99 tubarões
de seis espécies (incluindo tubarões-azuis e tubarões-anequim)
entre 2006 e 2014 no Atlântico Norte. E analisaram os trajectos de
186 navios de pesca ibéricos (23 portugueses) entre 2003 e 2012.
Desta forma, a equipa obteve um mapa que mostrava haver 80% de
sobreposição do habitat dos tubarões-azuis e dos tubarões-anequim
com os locais onde os navios pescam. Além disso, cada tubarão
destas espécies está em média dois a três dias por mês perto de
um navio de pesca, havendo por isso condições para ser pescado.
“O
que choca nos resultados é os valores serem tão altos [para estas
duas espécies]”, observa Nuno Queiroz, acrescentando que estes
animais acabam por ter poucos refúgios onde estão livres da pesca.
Ainda assim, os resultados subestimam a realidade. O Atlântico é
explorado por cerca de 40 grandes frotas pesqueiras, incluindo de
países que não têm costa no Atlântico, como da Rússia e do
Japão. As frotas de Espanha e de Portugal, embora sendo importantes,
representam apenas uma parte dos navios que pescam os tubarões.
A
equipa descobriu que as zonas de sobreposição mais importantes são
onde há transições súbitas de água mais quente para água mais
fria, onde os cardumes de peixes como a sardinha ficam presos.
Regiões como as que existem mais a norte, entre a corrente quente do
Golfo e a fria de Labrador, ou a Sudoeste dos Açores, por cima da
Dorsal Médio-Atlântica, atraem especialmente os tubarões e os
navios que os pescam.
Segundo
a Lista Vermelha da União Internacional para Conservação da
Natureza, que avalia a vulnerabilidade de extinção das espécies, o
tubarão-anequim tem o estatuto de “vulnerável”, estando em
“risco elevado de extinção na natureza”. Já o tubarão-azul
tem o estatuto de “quase ameaçado”. “Há menos tubarões-azuis
do que há 40 anos no Atlântico”, diz Nuno Queiroz, que espera que
as quotas de pesca para estes animais avancem.
Fonte: Público
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