segunda-feira, 13 de abril de 2015

Selvagens. Espanha desbloqueia expansão do mar português


Madrid retirou objecções feitas em 2013 ao projecto de extensão da plataforma continental portuguesa por causa das ilhas Selvagens.
Espanha comunicou à ONU que não tem objecções ao projecto português de extensão da plataforma continental na região da Madeira, que permitirá alargar a soberania de Lisboa sobre o leito e o subsolo marinhos das 200 milhas para as 350, verificou ontem o DN.
Madrid, na nota publicada sexta-feira em espanhol no site da ONU, diz "reiterar [a posição assumida em 2009 de] que o governo espanhol não levanta nenhuma objecção" à proposta portuguesa.
Lendo o texto, não se percebe porque é que a Espanha reafirma formalmente o que já declarou em 2009. O motivo está omisso: o governo de Mariano Rajoy, em 2013, manifestara "a sua objecção" ao documento de Lisboa, suscitando entraves políticos na apreciação pela ONU da proposta de Portugal.
Espanha invocou as ilhas Selvagens - quando este subarquipélago da Madeira não está abrangido pelos novos limites propostos por Portugal -, tornando ilógico o argumento espanhol. Mas a inesperada oposição à iniciativa de Portugal coincidiu com o agravamento das tensões entre Madrid e Londres sobre Gibraltar, oficialmente porque as autoridades do território britânico estavam a colocar recifes ao largo.
A nota verbal entregue na sexta--feira por Espanha aparenta assim ser um volte-face diplomático face a Portugal junto da ONU, um reconhecimento implícito de que a declaração oficial de 2013 constituiu um erro. E parece ainda uma contrapartida para o facto de Portugal, semana e meia antes, ter declarado que "não se opõe" a que a ONU se pronuncie sobre a proposta espanhola (entregue em Dezembro passado) de alargar a sua plataforma continental para oeste das Canárias.
Isto levou Marrocos, no passado dia 16 de Março, a reafirmar a sua oposição por estarem abrangidas as águas do Sara Ocidental. Note-se que a diplomacia de Madrid também se alterou face a Rabat: em 2009 referiu expressamente "a plataforma continental da margem continental sarauí"; em 2014, ao entregar a proposta formal, Espanha falou apenas em "direitos de terceiros que possam ser reclamados."
Em relação a Portugal, recorde-se que existe uma zona de sobreposição das duas plataformas estendidas, com mais de uma dezena de milhar de quilómetros quadrados, disputada pelos dois países e que se supõe rica em hidrocarbonetos (ver página 20).
Daqui resulta que, após a ONU aprovar a extensão da plataforma espanhola (prevista para vários anos depois de ser validada a portuguesa), Lisboa e Madrid negociarão uma fronteira marítima comum.
Submissão em 2009
O caso remonta a 2009, quando Portugal se tornou o 44.º país a submeter formalmente um projecto de extensão da plataforma continental de 200 milhas (321 km) para 350 milhas (563 km) - em 18 dossiers, com cerca de 16 mil páginas, para fundamentar o alargamento da sua jurisdição marítima dos actuais 1,7 milhões de quilómetros quadrados (18 vezes a área do continente) para quase quatro milhões (40 vezes mais).
Portugal tem a terceira maior ZEE da Europa, exercendo soberania sobre as primeiras 12 milhas e jurisdição até às 200 (incluindo espaço aéreo, água, solo e subsolo, podendo aí exercer direitos de soberania sobre os recursos). Daí até às 350 milhas, o poder do Estado exerce-se só sobre o solo e o subsolo, onde os estudos realizados indicam haver recursos vivos, minerais e energéticos potencialmente muito valiosos.
Em Junho de 2013, Madrid comunicou que "o governo de Espanha não se opõe ao pedido de Portugal para que a Comissão [de Limites da Plataforma Continental] considere a documentação relativa à região das ilhas da Madeira, sem prejuízo dos direitos de Espanha relativamente à extensão da sua plataforma continental na área oeste das ilhas Canárias".
Esta posição reflectia o consenso entre as comissões técnicas bilaterais encarregues dos trabalhos, expresso na proposta que a Espanha entregou - no mesmo dia do projecto português, a 11 de maio de 2009 - para a Região do Banco da Galiza.
Testemunho disso foi a nota entregue três semanas depois por Portugal, declarando "não ter objecção" a que a ONU se pronunciasse sobre a proposta de alargamento da plataforma continental na Galiza.
Daí a surpresa com que Lisboa recebeu, a 5 de julho de 2013, a nota em que Madrid dizia "relembrar a sua objecção à submissão de Portugal" junto da ONU. "Deve notar-se que, enquanto o governo português deseja que as Nações Unidas reconheçam a sua ZEE e plataforma continental em 2015 e incluindo as ilhas Selvagens" naqueles dois espaços, "a Espanha não concorda que as ilhas Selvagens possam ter de alguma maneira uma ZEE" com 200 milhas de extensão e em direcção ao espaço das ilhas Canárias.
No entanto, Espanha "concorda que [as Selvagens] tenham mar territorial" - com 12 milhas, quase um vigésimo da extensão da zona económica exclusiva - "porque as classifica como rochas".
Portugal reagiu dois meses depois, observando que "as ilhas Selvagens não estão, em qualquer circunstância, reflectidas na submissão portuguesa" à ONU.

Fonte: DN

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