A ilha de Palmerston, situada no Oceano Pacífico, abriga uma das comunidades mais isoladas do planeta. Visitada por um navio abastecedor duas vezes por ano - quando muito -, fica tão longe de outras regiões habitadas do mundo que apenas os mais intrépidos aventureiros conseguem pisar o seu solo. Curiosamente, a maioria dos seus 62 habitantes descende de um único homem: um inglês que se instalou ali há 150 anos.
Palmerston pertence a um grupo de ilhas conhecidas como Cook Islands, ligadas por um recife de corais que circunda as águas calmas de uma lagoa central.
Os recifes, no entanto, são demasiado altos, impedindo que hidroaviões pousem na lagoa. Do lado de fora, as águas muito agitadas também dificultam o pouso de aeronaves. A ilha é demasiado distante de outros pontos habitados, o que também impossibilita o acesso por helicópteros convencionais.
Portanto, só se pode chegar a Palmerston pelo mar. E são nove dias, por barco, da terra habitada mais próxima.
A ilha só pode ser avistada a três quilómetros de distância. E quando o tempo está mau, não dá para vê-la. Ao longo dos anos, dezenas - senão centenas - de barcos colidiram contra os recifes que se escondem sob as ondas, deixando muitos marinheiros presos na ilha.
O naufrágio mais recente aconteceu há três anos. O barco ainda pode ser visto, na praia, com um imenso buraco na carcaça. Peças desses navios - motores, madeira, mastros - tudo isso é reaproveitado pelos ilhéus. Nada é desperdiçado em Palmerston.
Navegar em segurança por entre as barreiras naturais que cercam a ilha é algo que só se aprende com anos de prática.
Bob é o chefe de uma das três famílias que vivem na ilha. Elas competem entre si para chegar até aos poucos iates que visitam a ilha anualmente. Quem vence a corrida toma conta dos visitantes. Os ilhéus orgulham-se da sua hospitalidade e deliciam-se em ter companhia extra.
Essa generosidade, a etiqueta da ilha, o seu sistema legal e as suas tradições foram passados oralmente entre gerações. E são um legado de um único homem, nascido no condado de Leicestershire, em Inglaterra, há mais de 16 mil km de distância.
William Marsters foi o primeiro homem a habitar Palmerston permanentemente, há 150 anos.
Ele viveu nas Cook Islands a partir de 1850 e, por volta de 1860, foi nomeado o administrador de Palmerston pelo então dono da ilha, o mercador britânico John Brander. Ele mudou-se para a ilha em 1863 acompanhado da mulher e duas primas, todas nativas da Polinésia.
Marsters cobriu a ilha de coqueiros e, durante os primeiros anos, os navios de Brander paravam no local a cada seis meses para recolher o óleo de coco que ele produzia. Aos poucos, as visitas tornaram-se mais raras, e seis meses transformaram-se em três anos. Até cessarem por completo: John Brander tinha morrido.
A rainha Vitória deu a Marsters a posse da ilha. Ele casou com as primas da mulher e, juntas, as três famílias tiveram 23 crianças. Antes de morrer, em 1899, ele dividiu a ilha em três partes, uma para cada mulher. Hoje, apenas três dos residentes de Palmerston não são descendentes directos de William Marsters.
Oficialmente, Palmerston é um protectorado da Nova Zelândia e dela depende para muitos dos confortos tidos como banais noutros lugares. Moradia, energia e Internet (durante duas horas por dia) e, para alguns mais sortudos, sinal de telemóvel.
Mas não existem lojas na ilha. Há apenas duas casas-de-banho. Os ilhéus bebem água da chuva e o dinheiro é usado apenas para comprar mantimentos do mundo exterior, nunca entre os moradores.
Bob é o presidente da câmara de Palmerston e mora numa das extremidades da rua principal. É uma faixa de terra com menos de cem metros de comprimento e abriga meia dúzia de prédios.
Num dos lados da rua está a igreja. Ela é central para a vida da comunidade. Também é uma das construções mais novas - e mais robustas - da ilha. O sino pintado de branco é tudo o que resta da igreja anterior.
Sem qualquer outra terra por perto, Palmerston recebe a força total de qualquer tempestade. Então, os moradores amarram as construções às árvores. Em 1926, um tufão atingiu a ilha, arrancando a antiga igreja do solo.
Aos domingos, o sino toca às dez da manhã, chamando a comunidade para a missa. Nesse dia, não se trabalha nem se brinca até às 2:00 da tarde.
Depois da missa, é hora de comer. A comida é parte fundamental da vida na ilha. Para a maioria dos palmerstonianos, a pesca toma grande parte do dia. Como visitante, é impossível sair de casa sem receber convites para quatro almoços diferentes.
O peixe preferido dos ilhéus é o Calotomus zonarchus, conhecido popularmente como parrotfish (ou peixe-papagaio).
Aliás, o peixe é o alimento principal em Palmerston e também é o único produto de exportação da ilha. Entre uma e duas toneladas de peixe-papagaio são congeladas e apanhados pelo navio abastecedor que, duas vezes por ano, leva produtos básicos, como arroz e combustível, para a ilha.
A localização remota da ilha também cria outros desafios. Ir ao dentista, por exemplo, torna-se um grande empreendimento. Quando a moradora mais idosa da ilha, Mama Aka, com 92 anos, foi receber tratamento dentário em Rarotonga, capital das Cook Islands, levou quatro dias para chegar lá. Mas após a consulta, que foi rápida, teve de esperar seis meses por um navio que a trouxesse de volta.
E se, para alguns, o isolamento é o grande atractivo da vida em Palmerston, para outros, pode ser uma ameaça. Particularmente porque, com excepção de dois professores e uma enfermeira, todos na ilha são familiares.
Bill teve seis filhos com a sua primeira esposa, uma mulher que ele pensava ser sua prima de segundo grau. Mas quando ela era muito nova, tinha sido entregue a outra família pelos pais - prática comum na ilha. Na verdade, Bill e a mulher eram primos de primeiro grau.
O isolamento leva muitos a deixar a ilha. Entre 1950 e 1970, a população de Palmerston chegou a 300.
Um terço da população são crianças, todos parecem saudáveis e felizes ao participar das aulas na escola da ilha. Mas muitos esperam partir para as cidades a centenas de quilómetros de distância. Sonham com mais conforto, melhores salários e, quem sabe, um marido ou uma mulher.
Fonte: Diário Digital
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