O valor económico da pesca e as tradições culinárias tendo por base os produtos do mar nacional, que ainda resistem, foram algumas das abordagens a 28 de Junho na tertúlia «A Gastronomia e a Pesca». O encontro, no Centro das Artes Culinárias (Mercado de Santa Clara), recordou a importância da fataça e da sardinha nos comeres portugueses.
No mês em que a sardinha é rainha de Norte a Sul do país, esta tertúlia juntou no Mercado de Santa Clara vários intervenientes do sector da pesca, que reflectiram sobre a importância da gastronomia associada àquele peixe.
Sasha Lima, do Centro das Artes Culinárias, foi a primeira convidada oradora a falar sobre o tema, tendo aproveitado a exposição patente actualmente naquele espaço – «Comeres Nómadas – Práticas e Objectos», para se referir à forma como no século XX a fataça (ou tainha, como é também designada) «era muito utilizada na cozinha e economia avieiras. Estes nómadas do rio, que partiram da Praia da Vieira para as margens do Tejo tinham uma gastronomia muito particular, e no caso da fataça, cozinhavam-na na telha, sendo preparada segundo os usos dos pescadores locais. Colocavam a tainha envolta em massa de pão para não deixar escorrer a gordura do peixe», pormenoriza a responsável.
Sasha Lima recordou esta receita avieira para salientar a importância do peixe do rio na gastronomia tradicional portuguesa, algo, sustentou, «que se foi abandonando e quase se perdeu». «Estamos num território de rios e temos uma relação com eles histórica, relação esta que tem morrido aos poucos. No fundo é a mesma coisa que dizer que temos rios mudos», critica, acrescentando que «não damos valor a estas riquezas gastronómicas ribeirinha».
A par da fataça, a responsável do Centro das Artes Culinárias, lembrou ainda outra tradição como a sardinha assada no enguiço (muito típica no norte do país, sobretudo da Póvoa de Varzim), e que «basicamente era confeccionada num enguiço (ou pedra). Uma receita em que se dispunham as sardinhas sobre o enguiço e acendia-se a pedra nos seus quatro lados. E é impressionante em como as sardinhas assam enquanto a caruma queima, deixando-as pretas mas não queimadas. O sabor é único».
Por tudo isto Sasha Lima apelou ao público presente no evento que «olhe cada vez mais para a importância do consumo de peixe e da riqueza que este traz à gastronomia tradicional».
«Mais-valia do pescado para a economia»:
Já Maria Leonor Nunes, da Divisão de Aquacultura e Valorização/Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), realçou «a importância da pesca na nossa alimentação» mas também a tradição do consumo de peixe em Portugal e «a mais-valia que o pescado acrescenta à economia. Sinal disso é o facto, por exemplo, de o atum ter sido determinante no Algarve, a sardinha no Norte, tendo isso levado, no século passado e anteriores, ao desenvolvimento económico destas zonas do país», sublinhou.
Já Maria Leonor Nunes, da Divisão de Aquacultura e Valorização/Instituto Português do Mar e da Atmosfera (IPMA), realçou «a importância da pesca na nossa alimentação» mas também a tradição do consumo de peixe em Portugal e «a mais-valia que o pescado acrescenta à economia. Sinal disso é o facto, por exemplo, de o atum ter sido determinante no Algarve, a sardinha no Norte, tendo isso levado, no século passado e anteriores, ao desenvolvimento económico destas zonas do país», sublinhou.
A responsável lembrou igualmente a importância da indústria conserveira no país. «Chegámos a ter, em Portugal, 350 fábricas de conservas de peixe, e recordo que, por exemplo, fomos fornecedores de conservas de sardinha na I e II guerras mundiais». Por tudo isto, Maria Leonor Nunes vincou a ideia «da diversidade de pescado que temos» e a «capacidade única de ter uma gastronomia rica».
«Nem sempre nos lembramos mas a verdade é que o peixe é o único produto a conter Ómega 3 no seu estado natural, além de conter minerais como o iodo e proteínas facilmente digeridas. O peixe é também um excelente produto na prevenção de doenças cardiovasculares, por isso, pelo menos duas vezes por semana devíamos ter pescado à mesa», afirma.
Seguiu-se Ana Paula Queiroga, da Fileira do Pescado, que, referiu, por seu turno, que, nestes tempos de crise económica, e ao contrário do que se possa pensar, é possível fazer refeições de peixe extremamente ricas, e a baratas».
E deu o exemplo da cavala, «uma espécie de valor comercial baixo, pouco consumida, tida como pobre, mas que tem um valor nutricional elevadíssimo». «A Fileira do Pescado tem tentado potenciar não só o seu valor económico mas divulga-lo pelas excelentes propriedades que possui».
«Benefícios para a saúde»:
Ana Paula Queiroga disse ainda que é «fundamental perceber outro lado da questão que associa a pesca à gastronomia» e que tem que ver com a componente da sustentabilidade. «Consumir peixe tem, obviamente, efeitos benéficos para a saúde, mas é preciso não esquecer que os recursos não são ilimitados. Por isso, é importante que o consumidor final saiba que as artes da pesca não têm todas o mesmo impacto ambiental. Pescar através da pesca do arrasto, anzol ou cerco é falar de coisas completamente diferentes do ponto de vista dos recursos», acrescentou, lembrando que é «muito importante que o consumidor final tenha acesso a este tipo de informação no acto da compra».
Ana Paula Queiroga disse ainda que é «fundamental perceber outro lado da questão que associa a pesca à gastronomia» e que tem que ver com a componente da sustentabilidade. «Consumir peixe tem, obviamente, efeitos benéficos para a saúde, mas é preciso não esquecer que os recursos não são ilimitados. Por isso, é importante que o consumidor final saiba que as artes da pesca não têm todas o mesmo impacto ambiental. Pescar através da pesca do arrasto, anzol ou cerco é falar de coisas completamente diferentes do ponto de vista dos recursos», acrescentou, lembrando que é «muito importante que o consumidor final tenha acesso a este tipo de informação no acto da compra».
O último orador desta tertúlia foi Henrique Vaz Pato, gerente de um espaço comercial – Sol e Pesca – que funciona como bar/loja de conservas, na zona do Cais do Sodré, e que falou da sua experiência de três anos nesta área. Para Henrique, «não há muitos produtos como as conservas portuguesas» e através da sardinha, do atum, da cavala, do polvo, da enguia e outros produtos do mar, tenta «ressuscita» no Sol e Pesca «uma tradição gastronómica nacional antiga» ao mesmo tempo que «valorizamos os produtos da forma mais simples possível».
O responsável, que lançou também um livro de receitas tradicionais, salientou que para que a pesca possa «dar as mãos com sucesso à gastronomia é fundamental dois objectivos: contribuir no consumo e na produção para a diversidade».
Depois da tertúlia, que decorreu ao final do dia, realizou-se uma degustação de pratos confeccionados à base de pescado, como cavala, lapas e peixe-pica (ou peixe-agulha).
Recorde-se que o encontro «A Gastronomia e a Pesca» decorreu no âmbito do ciclo de tertúlias sobre a Pesca que resultam de uma parceria entre a Sciaena – Associação Ciências Marinhas e Cooperação (Sciaena) e a Liga para a Para a Protecção da Natureza (LPN).
Os debates, de entrada gratuita, realizam-se no final de cada mês (excepto em Julho e Agosto), estando subordinados a diferentes temáticas.
A primeira conversa realizou-se a 31 de Janeiro e debateu a «Fiscalização, controlo e combate à pesca ilegal, não declarada e não regulamentada», sendo que a 28 de Fevereiro o debate centrou-se nas «Dimensões socioculturais da pesca».
«O emprego e a pesca» (30 de Maio), «A gastronomia e a pesca» (27 de Junho), «A pesca lúdica» (26 de Setembro), «Modelos de comercialização dos produtos da pesca e aquacultura» (31 de Outubro), «O papel da ciência nas pescas» (28 de Novembro), «Uma visão estratégica para as pescas nacionais» (19 de Dezembro) completam este ciclo de tertúlias.
Fonte: Café Portugal.
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