quarta-feira, 25 de setembro de 2019

Nível dos oceanos pode subir com consequências para mais de mil milhões de pessoas, alerta novo estudo da ONU


Sem acção urgente para reduzir emissões de gases com efeito de estufa, os gelos permanentes vão derreter a um ritmo sem precedentes, elevando o nível dos oceanos com consequências para mais de mil milhões de pessoas, advertem peritos da ONU.


O alerta consta de um relatório lançado esta quarta-feira no Mónaco pelo Painel Intergovernamental sobre Alterações Climáticas (IPCC), criado pelas Nações Unidas, dedicado ao impacto climático nos oceanos e na criosfera, as regiões cobertas por gelo e neve permanentes que constituem 10 por cento da superfície do planeta.
Durante este século, os oceanos deverão sofrer alterações “sem precedentes”, com temperaturas mais altas, água mais ácida, com menos oxigénio e condições alteradas de produção de recursos.
“Ondas de calor marinhas e fenómenos extremos ligados aos (fenómenos meteorológicos) ‘El Niño’ e ‘La Niña’ deverão tornar-se mais frequentes”, preveem os cientistas do IPCC, que ressalvam que “a frequência e a gravidade destas mudanças será menor num cenário de emissões de gases com efeito de estufa reduzidas”.
O IPCC estabelece que “o oceano e a criosfera acolhem habitats únicos e estão ligados a outros componentes do sistema climático através de trocas globais de água, energia e carbono”.
Alterações neste sistema afetam mais de mil milhões de pessoas em todo o mundo, desde os cerca de quatro milhões que vivem no Ártico aos 680 milhões das zonas costeiras e aos 670 milhões que se contam nas zonas de alta montanha, que poderão chegar aos 840 milhões dentro de 30 anos.
Os cientistas do painel constataram que o oceano global tem vindo a aumentar de temperatura desde 1970, absorvendo “mais de 90% do calor em excesso no sistema climático”, com ondas de calor marinho duas vezes mais frequentes desde 1982.
“Ao absorver mais dióxido de carbono, o oceano sofreu um aumento da acidez à superfície”, apontam os cientistas, considerando muito provável que 20% a 30% do dióxido de carbono (CO2) emitido pela atividade humana desde 1980 foi parar ao oceano e provocou uma perda de oxigénio desde a superfície marinha até aos mil metros de profundidade.
O nível médio global do oceano está a subir, com aceleração nas últimas décadas devido às perdas cada vez maiores das massas de gelo da Gronelândia e da Antártida e da perda continuada da massa dos glaciares e tem havido “aumentos da precipitação e de ventos tropicais ciclónicos, com episódios climáticos extremos que representam um risco para as zonas costeiras”.
O IPCC aponta uma subida “sem precedentes” do nível médio global dos oceanos no período de 2006 a 2015 em relação ao último século, a um ritmo de 3,6 milímetros por ano, atribuindo-a principalmente às massas de gelo e glaciares que derreteram.
Na Antártida, as perdas de gelo “triplicaram no período entre 2007 e 2016 em relação ao período 1997-2006”, lê-se no relatório em que se conclui com “confiança alta” que “a causa dominante da subida do nível médio do mar desde 1970 tem origem humana”.
A projeção dos cientistas é que a subida do nível dos oceanos atinja 15 milímetros por ano em 2100 e “vários centímetros por ano no século XXII”.
Níveis elevados das águas que se verificavam uma vez por século poderão ser uma realidade anual neste século.
Entre as consequências, o relatório aponta “alterações nas atividades sazonais e na abundância e distribuição de espécies animais e vegetais importantes ecológica, cultural e economicamente”, com “perturbações ecológicas e no funcionamento dos ecossistemas” e aumento do risco de extinção de espécies adaptadas a temperaturas baixas.
A perda das massas de gelo deverá “afetar recursos aquáticos e o seu uso”, com a libertação de metais como o mercúrio na água dos rios, consequências para a saúde, e na agricultura de zonas no sopé de montanhas, com “alterações nas cheias, deslizamentos de terras, avalanches e desestabilização dos solos”, com efeitos nas atividades humanas, da agricultura ao turismo.
Nos últimos 100 anos, “perto de 50% das zonas húmidas costeiras perderam-se em resultado da pressão humana, subida do nível do mar, aquecimento e eventos climáticos extremos”, perdendo-se “ecossistemas vegetais costeiros que protegem o litoral de tempestades e da erosão” e que absorviam dióxido de carbono, refere também o documento.
A tendência é para os glaciares continuarem a derreter nas próximas décadas: “as massas gelo da Gronelândia e Antártida deverão continuar a derreter a um ritmo crescente durante o século XXI e mais além”, uma realidade agravada no cenário de continuarem a aumentar as emissões de gases com efeito de estufa.
Medidas de mitigação dos efeitos descritos “ambiciosas e adaptação eficaz” são a única maneira de contrariar “os custos e riscos crescentes” de continuar a adiar ações concretas para limitar o aquecimento global.
“As pessoas mais expostas e vulneráveis são muitas vezes as que têm menos capacidade para responder”, nota o IPCC, frisando que muitas iniciativas ao nível governamental (como proteção de áreas marinhas ou sistemas de gestão de águas) estão “demasiado fragmentados em muitos setores administrativos” para serem eficazes face “aos riscos crescentes provocados pelas alterações climáticas”.
Entre as medidas apontadas como positivas, o IPCC refere a recuperação de ecossistemas vegetais costeiros, que poderão absorver cerca de “0,5% das emissões anuais atuais” e emitir menos dióxido de carbono, proteger o litoral de tempestades, aumentar a qualidade da água e trazer benefício à biodiversidade.
“Apesar das grandes incertezas sobre o ritmo e dimensão da subida do nível dos oceanos depois de 2050”, as comunidades costeiras beneficiarão de planeamento atempado, com “respostas flexíveis” que possam ir sendo adaptadas à realidade, diz o IPCC, admitindo medidas que podem ir de sistemas de alerta de cheia à relocalização de pessoas antes ou depois de desastres.
A redução “urgente e ambiciosa” de emissões é fundamental, consideram os cientistas, que defendem a mesma ambição para medidas de adaptação às alterações climáticas.
“Educação e literacia climática, monitorização e previsão, uso de todas as fontes de conhecimento disponíveis, partilha de dados, informação e conhecimento, financiamento e apoio institucional” são essenciais, salientam ainda. 

Foto: NSIDC/Ted Scambos

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