terça-feira, 5 de maio de 2015

Novas medidas procuram limitar CO2 dos navios

Europa passa a exigir monitorização das emissões. Ilhas Marshall propõem metas globais de redução.


Um novo regulamento europeu e outras propostas a nível mundial estão a desafiar a liberdade com que os navios lançam gases com efeito de estufa para o ar sem prestarem contas a ninguém.

O tema está na agenda de uma reunião da Organização Marítima Internacional (OMI) que terá lugar este mês, em Londres, e foi debatido e votado na terça-feira passada no Parlamento Europeu.

Os eurodeputados deram a sua aprovação final a um regulamento segundo o qual os navios que utilizem portos europeus terão de monitorizar as emissões de CO2 (dióxido de carbono) das suas viagens a partir de 2018. Os dados serão verificados e reportados à Comissão Europeia, que os divulgará publicamente.

O que a UE pretende é que, com base nesses dados, as empresas transportadoras dêem preferência a embarcações com menor pegada carbónica, já que menos emissões resultam de um menor consumo de combustível. E isso poderá ainda ter um efeito a montante. “É um incentivo para que os donos dos navios adoptem soluções mais eficazes em termos energéticos”, afirma o eurodeputado português José Inácio Faria, eleito pelo Movimento do Partido da Terra e relator do Parlamento Europeu para a discussão desse regulamento.

As normas valem para grandes navios, com mais de 5000 toneladas de peso bruto – representando 55% dos que transitam pela UE e 90% das emissões de CO2. Independentemente da bandeira sob a qual navegam, se utilizarem portos europeus terão de ter um certificado a provar que fazem a monitorização exigida. Se falharem, haverá sanções, ainda por definir por cada Estado-membro.

A UE está a dar um primeiro passo, e algo polémico, numa área difícil de regulamentar a nível internacional. Tal como os aviões, os navios ainda são uma das áreas cinzentas do controlo das emissões dos gases com efeito de estufa. A sua contribuição para o problema não é negligenciável: 949 milhões de toneladas de CO2 em 2012, segundo dados da Organização Marítima Internacional. São cerca de 3% das emissões totais a nível mundial ou 14 vezes as de Portugal.

A maior parte deste CO2 – cerca de 84% – é libertada quando as embarcações estão em alto mar, fora da jurisdição de qualquer país. Daí que seja mais difícil a sua regulamentação.

A UE contornou esta limitação colocando a tónica no controlo que é feito nos seus portos. Mas desta vez foi mais cautelosa do que quando integrou a aviação no comércio europeu de licenças de emissões, em 2012. Na altura, impôs um limite ao CO2 total dos voos de e para a Europa. As companhias aéreas reagiram mal e Bruxelas acabou por recuar. Manteve apenas os voos internos no mercado de carbono e deixou o resto nas mãos da Organização Internacional para a Aviação Civil, onde uma solução global deve ser aprovada em 2016.

Para os navios, a Organização Marítima Internacional (OMI) já adoptou um índice de eficiência energética, em vigor desde 2013 e que obrigará a uma diminuição progressiva das emissões de CO2 por distância percorrida e carga transportada. A meta é chegar a 30% de redução em 2025, em relação à geração actual de navios.

O índice aplica-se, porém, apenas aos navios novos. E o aumento da eficiência energética pode ser anulado pelo maior trânsito nos oceanos previsto para as próximas décadas. A própria OMI estima que, sem medidas adicionais, as emissões da navegação marítima podem aumentar entre 50 a 250% até 2050.

Na próxima reunião do Comité para a Protecção do Ambiente Marinho da OMI, de 11 a 15 de Maio em Londres, a questão do CO2 dos navios vai estar sobre a mesa. As Ilhas Marshall, sob cuja bandeira de conveniência navegam cerca de 1600 navios, propõem que seja fixada uma meta de redução de emissões e correspondente medidas.

A UE não quer perturbar as negociações internacionais, mas pretendeu, com o seu regulamento, dar um sinal. “Teve-se de ter muito cuidado para não ferir susceptibilidades. Não queríamos criar conflitos”, diz o eurodeputado José Inácio Faria. “Mas quisemos demonstrar que a Europa está a liderar neste tema”, completa.

Entre os armadores, a iniciativa europeia foi recebida com críticas. “O primeiro aspecto com o qual estamos em desacordo é o de que, estando esta questão a ser discutida a nível mundial, a União Europeia introduza um regulamento com aplicação a nível comunitário”, argumenta Joaquim Coelho, secretário-geral da Associação de Armadores da Marinha de Comércio. “O problema é mundial, e não europeu”, prossegue.

O que também preocupa os armadores é a eventual divulgação de dados que possam ser segredos comerciais e o estabelecimento de sanções ou metas obrigatórias. Nas posições que tem tomado desde 2013, a Comunidade Europeia de Associações de Armadores disse que a iniciativa europeia é bem-vinda mas desde que se restrinja à recolha de dados, deixando para a OMI decidir sobre a conveniência de haver metas de redução ou mecanismos de mercado para controlar as emissões.

Muitos proprietários, porém, preferem divulgar do que esconder os dados sobre a eficiência energética dos seus navios. Há cinco anos, a organização não-governamental Carbon War Room – do milionário britânico Richard Branson, fundador do grupo Virgin – lançou uma plataforma voluntária de classificação de navios, de A a G, conforme a sua eficiência energética, tal como os electrodomésticos.

Hoje, a base de dados já tem 75.000 embarcações e é utilizada por empresas que representam 23% do mercado de fretamento de navios. “A eficiência energética já faz parte do seu processo de decisão”, afirma Victoria Stulgis, especialista da Carbon War Room. Dois bancos ligados à indústria marítima – o HSH Nordbank e o KfW IPEX-Bank – também estão a recorrer ao sistema para fundamentar as suas decisões de investimento.

Se o novo regulamento europeu funcionar, o mesmo pode acontecer numa escala talvez maior, abrangendo armadores que não tenham aderido àquele sistema voluntário. “Dará para se ter uma ideia global da eficiência dos navios”, conclui José Inácio Faria. 

Fonte: Público



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