terça-feira, 28 de maio de 2019

Eco-viagem’ Roterdão-Xangai: navio da Maersk Line já faz história nos mares


O Porto de Roterdão lançou um vídeo que regista o histórico momento em que um navio da transportadora nórdica Maersk Line (de seu nome ‘Mette Maersk’) arranca a sua jornada ecológica rumo a Xangai.
Este foi o zarpar que marca o arranque da iniciativa de sustentabilidade ambiental no contexto do Shipping, liderada pela operadora dinamarquesa, líder global no mercado do transporte marítimo contentorizado.
Projecto conta com o apoio da Shell, Unilever, Phillips e Heineken
O projecto, que conta com o suporte e cooperação de de empresas como a Shell, a Heineken, a Unilever e um grupo de empresas de peso no âmbito da indústria holandesa (como a Phillips), consiste no teste de um navio alimentado por um biocombustível feito à base de óleo de cozinha.

‘Eco-viagem’ do navio da Maersk Line poupará 1,5 milhões de quilos de CO2

A iniciativa (anunciada no dia 22 de Março) trata-se do maior projecto de sustentabilidade ambiental no domínio do Shipping, utilizando o colosso dos mares ‘Mette Maersk’ (classe Triple E) para comprovar a meta de poupar 1,5 milhões de quilos de CO2 durante a viagem que actualmente decorre e que terminará na cidade de Xangai (China).
O retorno do navio da Maersk Line está previsto para Junho – os resultados desta inovadora experiência serão analisados e todas as partes buscarão identificar outras acções futuras para descarbonizar o transporte marítimo de mercadorias.

segunda-feira, 27 de maio de 2019

Micróbios que comem plástico poderão ser solução para poluição dos oceanos


Não é por acaso que as organizações dedicadas a alertar e combater a poluição estão cada vez mais em voga. Não é por moda, é mesmo por urgência. Há cada vez mais lixo nos oceanos e o plástico é um cancro que tem de ser combatido. Assim, poderá ter surgido uma fonte inesperada de apoio para a resolver esse terrível problema ambiental: micróbios marinhos que comem plástico, limpando o lixo omnipresente.
Sabia que actualmente há mais de 150 milhões de toneladas de plástico nos oceanos? Sabia que há uma estimativa que refere que por ano entram nos oceanos cerca de 4,8 a 12,7 milhões de toneladas de plástico?
Numa recente investigação, uma equipa internacional de cientistas estudou a forma como certas comunidades microbianas se acumulam nos plásticos poluidores do oceano. Dessa forma, foi percebido que a acumulação resulta para a degradação desse plástico. Assim, estamos perante um mecanismo biológico natural que poderíamos explorar. Mas para tal, é preciso que este seja mais bem compreendido.

Uma vez que o plástico entra no oceano, torna-se intemporal. Quer isto dizer que não se pode calcular o tempo de vida. Assim, existem vários factores não biológicos, incluindo radiação UV, temperaturas flutuantes e forças de abrasão na água do oceano, que podem determinar esse tempo.
Estes processos ambientais iniciam a devolução do material em fragmentos de microplásticos e nanoplásticos cada vez menores. No entanto, estes agentes não agem sozinhos.
A degradação abiótica precede e estimula a biodegradação desde que os grupos carbonilo são gerados na superfície [do plástico].
Portanto, uma ampla gama de organismos pode estabelece-se na superfície desgastada, usando-a como substrato e como fonte de carbono.
Referiram os investigadores liderados pelo engenheiro ambiental Evdokia Syranidou da Universidade Técnica de Creta na Grécia.
Praias são “santuários” de amostras de plásticos deteriorados pelos oceanos
Para estudar o quão eficiente é esta mastigação microbiana, em termos de partir ainda mais os plásticos, os investigadores recolheram amostras de detritos de polietileno (PE) e poliestireno(PS) naturalmente desgastados em duas praias da Grécia.
Segundo os investigadores, estes resíduos recolhidos foram lavados e depois cortados em pequenos pedaços. Posteriormente, os fragmentos de plástico foram mergulhados numa solução salina que agia tal como se fosse água do oceano.
Estes fragmentos foram então expostos a dois tipos diferentes de comunidades microbianas: organismos que ocorrem naturalmente no oceano (compreendendo várias espécies diferentes), e estirpes bio-aumentadas ajustadas para formar biofilmes mais fortes em superfícies plásticas.

O tempo mostrou que o plástico era “comido” pelos micróbios

Após cinco meses de exposição microbiana, as peças de plástico foram pesadas, revelando que os organismos nativos haviam conseguido reduzir o peso do poliestireno em cerca de 11% e resistido ao polietileno até 7%.
A estirpe de bioengenharia não comeu tanto plástico, embora a equipa tenha observado que “parece mais eficiente em aderir às peças desgastadas e desenvolver uma comunidade de biofilme” de maior abundância.
Os resultados com mais sucesso, de longe, foram de uma experiência que usou “micróbios aclimatados” – organismos já expostos aos plásticos numa simulação anterior.
Por outras palavras, parece que estes micróbios podem desenvolver um gosto pelos plásticos e melhorar ao comê-los com o tempo.
Além de mastigar o plástico, a exposição microbiana também resultou em mudanças químicas na superfície dos materiais, produzindo grupos carbonílicos e ligações duplas. Revelando processos como a cisão de cadeias que afectavam o plástico no nível molecular.

Será que esta descoberta será a solução dos problemas?

Seguramente não é a primeira vez que os cientistas examinam o poder dos micróbios para lidar com problemas do plástico. Ademais, durante anos, os cientistas investigaram formas dos organismos poderem comer resíduos de plástico.
Cada avanço que é feito, não importa o quão pequeno seja, pode ajudar um dia nos esforços de limpeza. Na verdade, o problema está a montante, nos hábitos dos consumidores. A fonte do problema somos nós.
Os resultados são relatados no Journal of Hazardous Materials.

Carlos Antunes. ”Não há memória colectiva de uma subida do nível do mar como a que vamos ter”


A melhor estratégia é a acção imediata, avisa o investigador. Já para combater as alterações climáticas, não vê outra opção a não ser refrear o consumismo. 

Carlos Antunes, professor e investigador da Faculdade de Ciências de Lisboa e do Instituto Dom Luiz, é um dos autores dos mapas que permitem pela primeira vez ter a percepção das áreas mais vulneráveis no país à subida do nível médio do mar. Das cotas e marés mergulhou no estudo das variáveis das alterações climáticas e assume que a inquietação é grande. Para evitar o “colapso”, acredita que a única solução passa por aceitar que a prosperidade tem limites e que é preciso refrear o consumo. Em abril, a aplicação snmportugal.pt, que desenvolveu em conjunto com Cristina Catita e Carolina Rocha, também da FCUL - e onde é possível visualizar os cenários de subida do mar em Portugal - foi distinguida pela Ordem dos Engenheiros. Esperam que ajude a dar visibilidade a uma área em que é preciso investir já, para haver menos surpresas nas próximas décadas.
O que dizem os vossos cenários sobre a subida do mar por exemplo em Lisboa?
Temos cenários submersão frequente com a subida do nível médio do mar e cenários de inundação extrema, que é o que pode acontecer quando a maré atinge picos máximos em preia-mar (maré cheia) e sobretudo quando estamos nas marés vivas equinociais de Março e Setembro, as que têm maior amplitude. Olhando para a maré em Lisboa, no Cais Sodré, hoje chega à cota máxima de 2,48 metros, ali onde temos os estrangeiros a ver os rios e os barcos. Em 2050, com a subida do nível médio do mar, os cenários apontam para um máximo de 2,62 metros.
Que efeitos serão visíveis? 
Começamos a ter períodos do ano com duas, três, quatro horas com 20 centímetros de água. 
Em que não dá para circular de carro? 
Se a avenida não subir, pode não dar para circular. Mas isto sem nenhum efeito adicional de haver uma tempestade.
Vai ser preciso subir a marginal?
Não só em Lisboa. Vai ser preciso um conjunto de intervenções nas zonas costeiras e nas zonas de águas interiores, nomeadamente na ria de Aveiro e na ria Formosa. Voltando ao Cais Sodré, se em 2050 temos este problema sobretudo nas marés vivas de Março e Setembro, em 2100 todas as marés vivas em preia-mar podem gerar uma coluna de água de 90 centímetros e aí seria uma imobilização completa. As marés vivas são de 15 em 15 dias, na lua nova e na lua cheia.
Em Lisboa quais serão as zonas mais problemáticas? 
É possível fazer essa projecção detalhada, mas temos a zona do Cais Sodré, Santos, Alcântara, Belém, Algés.
Não é possível fazer a contenção com diques?
Seria preciso fazer diques em toda a ria de Aveiro, Faro, estuário do Sado, Mondego, vamos imaginar quanto custa. Este efeito já é em parte visível. As marés-vivas de 2018 e 2019 estão associadas a super-luas, um fenómeno que acontece de quatro em quatro anos ou cinco. No ano passado tivemos inundações nas marés vivas em Ferragudo, também já aconteceu em Tavira e no Seixal, que são sítios que têm uma cota mais baixa do que a preia-mar.
Quando é que são as próximas marés vivas equinociais com esse efeito?
A 29 de Setembro. Tivemos em 2010, em 2015, é agora em 2019 e depois em 2024.
É de esperar um grande impacto?
Não é por acaso que foram anos de grande erosão costeira, sendo que há a conjugação de outro fenómeno que é terem sido anos de aumento dos temporais no inverno. Se tivermos uma conjugação de marés vivas com temporal, as pessoas verão uma maré muito acima do que estão habituadas.
Um dos vossos cenários estima que em 2050 a área inundável devido à subida do nível do mar é de 903 km2, passando a 1146 km2 em 2100.
Mais uma vez isso é o que prevemos nos cenários extremos, nas marés vivas equinociais, que têm maior amplitude. Em termos gerais, podemos dizer que situações de inundação como vimos em Ferragudo serão cada vez mais frequentes e em mais sítios.
Há o risco de desaparecerem definitivamente praias?
Só se houver uma intensificação de temporais e se não for feita a reposição de areias, mas essa é uma área que o país tem estado a acautelar. O que acreditamos é que vai ser preciso subir avenidas marginais e eventualmente ter diques em algumas zonas. As medidas têm de ser planeadas caso a caso.
Já há municípios a fazer esse trabalho?
Temos trabalhado com a Câmara Municipal de Lisboa e temos um projecto com a Câmara Municipal de Loulé em que identificámos as áreas que vão ser afectadas até 2050, 2080 e 2100, portanto uma análise de risco por fases, em função da subida progressiva do nível do mar. Identificámos as infraestruturas que devem ser adaptadas - molhes, marina, praia, alguma zona urbana. Agora o que a câmara tem de fazer é um plano estratégico para definir o que tem de ser feito ao longo do tempo, que é o que tem sido feito em cidades como Nova Iorque. Mas a preocupação não é só das câmaras. Esta semana entregámos um relatório a um fundo de investimento privado que tem um empreendimento aprovado numa zona altamente vulnerável no Algarve e que veio ter connosco para lhe apresentarmos medidas de adaptação.
Costumam ter pedidos desses?
De um fundo privado foi o primeiro e ficámos muito surpresos. Estávamos à espera que nos caíssem em cima por podermos estragar o negócio mas foi o contrário, vieram à procura de solução. 
Em 2017 alertou publicamente que a base aérea do Montijo está numa zona extremamente vulnerável à subida do nível médio do mar. Ficou surpreendido com a decisão da construção do novo aeroporto? 
Sim e não. Nessa altura já tínhamos assinado um protocolo com o Ministério do Ambiente para que pudessem aceder aos nossos mapas de cartografia de risco costeiro e passados uns meses houve um contacto de um grupo de investigadores que analisou o impacto naquele projecto. Portanto algo foi feito. Não sou contra o projecto. Sendo um projecto a 40 anos, com uma vigência até 2060, tudo bem, para mais porque a parte onde se vai construir é a mais alta. O que alerto é para a base aérea, que terá de ser mudada. Como é uma subida paulatina, posso ir-me adaptando. É preciso é fazer planos e providenciar o financiamento. Situações extremas podem sempre ocorrer: limpa-se, renova-se e segue-se em frente. Agora quando pensamos a prazo, um novo edifício de habitação supostamente vai durar 100 anos ou mais, implica contratos de longa duração, direitos de transmissão e sucessão. É preciso ter este aspecto em conta.
Na semana passada, quando foi apresentada a Cidade da Água que vai nascer nos antigos estaleiros da Lisnave em Almada, lembrou que é mais um empreendimento numa zona altamente vulnerável. Qual é o risco?
Se os projectistas não tiverem em atenção os cenários de subida do nível médio do mar, poderão ter surpresas daqui a 60 ou 70 anos. Se quiserem que o projecto tenha maior longevidade, têm de se precaver. Isto é um trabalho de longo prazo. Se olharmos para o caso de estudo de Miami, as avenidas já subiram meio metro e o próprio mayor diz que estão a tomar medidas para daqui a 30, 40 anos.
Que infraestruturas o deixam mais preocupado?
A linha de Cascais por exemplo. Há vários troços de Algés ao Cais Sodré onde é altamente vulnerável, bem como a estação de metro do Cais Sodré e parques de estacionamento subterrâneos.
Na vossa aplicação estimam 60 mil edifícios e 146 mil residentes em áreas costeiras vulneráveis à subida do nível médio do mar em 2050 e 82 mil edifícios e 225 mil residentes em 2100. São pessoas que será necessário deslocar?
São pessoas potencialmente afectadas. Usámos dados de 2011, que consideram edifício até um quiosque. E mais uma vez estamos a falar de um cenário extremo, de uma maré viva com um temporal. Calculamos que 14% da população vive a 2 quilómetros da linha de costa. Terá de ser feita essa avaliação em cada local.
Quanto é que o mar deverá subir?
Até 2050 o cenário com maior probabilidade aponta para uma subida de 44 centímetros em relação ao início do século passado, sendo que nos últimos 100 anos o mar já subiu cerca 20 centímetros. Vai subir mais 23 centímetros. 
Onde são feitas essas medições?
Temos os dados do marégrafo de Cascais, que é o mais antigo da Península Ibérica, em funcionamento desde 1882. Os marégrafos servem para duas coisas: monitorizar as variações do nível do mar - um registo contínuo que serve para fazer a previsão da preia-mar, baixa-mar - e perceber a evolução história. Neste caso, o que nos mostra o marégrafo de Cascais é que nos últimos 100 anos, desde 1920 até hoje, o nível do mar subiu cerca 20 centímetros na costa portuguesa. Para Portugal, o cenário mais provável é uma subida de 1,15 metros até 2100. O Painel Intergovernamental para as Alterações Climáticas (IPCC) coloca o zero no ano 2000, pelo que se retirarmos 0,13 metros, a subida até esse ano, temos uma subida de 1,02 metros em 100 anos no século XXI.
Já tem sido referido que no final do século algumas cidades dos EUA poderão mesmo desaparecer. Não há esse risco cá?
O risco acrescido em alguns pontos do globo tem a ver com outro fenómeno, que é perceber se o continente está a emergir ou em subsidência. Miami está a afundar 6 milímetros ao ano e o mar está a subir 4mm, o que significa que por ano têm um centímetro a mais de subida do nível médio do mar. Nós estamos em uplift, a emergir, ainda que a uma taxa muito pequena, 0,1 mm por ano. Lembro-me de uma vez um autarca nos ter confrontado com um dos cenários de subida do nível do mar de 1,5m até 2100, quando a Escandinávia tinham valores mais baixos. A Escandinávia está numa zona sob influência da última glaciação e está a emergir um centímetro por ano, chama-se o ajuste isostático pós-glacial. Como eles estão a subir, estão a ver o nível do mar a baixar. É normal que prevejam uma subida de 20 cm até 2100, é o fenómeno ao contrário do que existe em Miami. Daí a importância de estudar o efeito relativo da subida do nível do mar para cada zona.
Quando começou a seguir esta linha de estudo?
Há 12 anos, sensivelmente. Estava a trabalhar com colegas de geologia que estudam micro-organismos em sapais, micro paleontologia. Estudam micro-organismos que vivem naquela zona inter-tidal, entre a baixa-mar e a preia-mar. Observam-nos em estuários e fazem furos para ir a 20, 30 metros buscar a mesma sequência de espécies. Fazendo datações, conseguem por exemplo inferir o nível médio de mar histórica. Sou de geodesia e um colega precisava de saber as marés em zonas do estuário do lado de dentro. A minha função era quase de topógrafo para ver as cotas. Começámos a ver marés diferentes, começo a pegar nos dados do marégrafo de Cascais, a analisar as séries.
Não perdendo cidades, imagina alguma coisa a desaparecer do mapa?
Uma vez ouvi alguém dizer que se ia perder o Monte da Caparica. Não faz sentido. Estamos a falar de um metro - as marés em vez de chegarem a 2 metros, 2,20, vão chegar a 3 metros, 3,20. Claro que dito isto, é preciso juntar à subida do nível médio do mar o fenómeno da erosão, que temos estado a conseguir mitigar mas que vai ter custos cada vez mais avultados com alimentações artificiais. Sistemas como as ilhas de Barreira no Algarve serão complicados. Há vários grupos a estudá-lo. A ilha da Fuzeta, podemos alimentá-la artificialmente, mas se a subida começar a intensificar-se, vamos perder a batalha. Vai tudo depender da subida. Se for uma magnitude abaixo de um metro, pode resistir com a ajuda de alimentação artificial.
O Ministério do Ambiente anunciou recentemente um reforço das praias da Costa ao longo de 3,8 quilómetros, um investimento de 6,3 milhões de euros. É por aí?
Sim. Na zona de Espinho, a sul da Foz do Douro, estima-se que desde os finais do século XIX se tenham perdido cerca de 50 milhões de metros cúbicos, quando só foram repostos 2,8 milhões. Há muita areia que teremos de repor. Na zona do sota-vento algarvio, a mesma coisa. Podemos ter situações em que só haverá praia em baixa-mar, como acontece na praia do CDS, na Costa da Caparica. Nesse campo há muitos projectos em curso, como a monitorização dos perfis de praia. Há também os Programas da Orla Costeira (POC), que prevêem em alguns casos relocalizações. É a estratégia adequada. A minha preocupação são as águas interiores. Há um programa dedicado aos estuários e sistemas lagunares que inclui as rias. Não estão sob a acção erosiva das ondas e onde não é visível para já o efeito da subida do nível do mar...
Mas vai ser?
Há uma exposição elevada. Gafanha da Nazaré, Vagueira, Olhão, Faro, Vilamoura, Vila Real de Santo António são zonas baixas do lado interior que com o efeito da subida progressiva das marés vão começar ao longo dos anos a ter zonas de inundação frequente. Aveiro foi a primeira cidade a ter uma eclusa para controlar marés se não estava sempre com inundações - o que está a acontecer em Ferragudo ou no Seixal começou em Aveiro nos anos 90. Mas as zonas interiores de contacto com as rias terão de ser adaptadas, assim como as infraestruturas portuárias. A marinha dos EUA tem um plano que nos serviu de referência para o trabalho que fizemos em Loulé. Das 800 bases navais no mundo inteiro, identificaram 60% que estão em zonas vulneráveis à subida do nível do mar. Definiram um plano com intervenções a cada 30 anos - sabem o que é preciso reforçar, subir, o que é para abdicar.
Ainda não temos esse levantamento?
Não. E temos em zonas altamente vulneráveis a base naval do Alfeite, o aeroporto de Faro, a base aérea do Montijo, estações fluviais do Seixal, Barreiro ou Belém, o porto da Gafanha da Nazaré, a linha de comboio de Cascais, vários equipamentos e infraestruturas de serviços fundamentais à vida das cidades que a partir de uma determinada data poderão ter problemas. Quando, não podemos prever ao certo, mas é para isso que temos cenários. Face a uma ameaça incerta, a melhor estratégia é agir já. Se não planearmos agora, pode chegar o momento e não haver disponibilidade financeira, até para resolver tudo ao mesmo tempo. Por isso ficámos de certa forma admirados com este fundo privado que nos contactou. Há 1% de probabilidade de a solução que lhes demos não garantir segurança ao edifício, mas será apenas por algumas horas, é o que é uma gestão de risco.
É essa a ilação que gostava que se tirasse da plataforma?
Sim, queremos alertar a consciência das pessoas e tentamos mostrar também o trabalho que temos estado a desenvolver com Lisboa, Loulé a comunidade intermunicipal da região de Coimbra. Para Lisboa estamos agora em conjunto com o IPMA e o Técnico a juntar o cenário de subida do nível médio do mar com o risco de tsunami, trabalhos que tinham sido feitos de forma independente. Que eu conheça, Lisboa é a cidade do país que está a dar mais atenção ao problema, com uma abordagem muito séria. Tem estado a libertar a zona ribeirinha, a entregar a cidade ao rio, que é uma estratégia para tornar a cidade mais resiliente. Vamos apresentar trabalhos à Carris, ao metro, à EDP.
Vão ser precisas muitas obras?
Vai ser preciso adaptação. Se temos estruturas que vão começar a ter inundações com frequência, é preciso intervir, não podemos deixar que chegue esse momento. O problema é que enquanto as ondas de calor vamos começando a sentir na pele, o nível do mar não se sente. As pessoas apercebem-se da erosão costeira, eventualmente pensam que a sua praia está a perder areia, agora o nível do mar subir um metro em 100 anos... A última vez que o mar esteve mais alto do que está hoje foi num período chamado eemiano que começou há 125 mil anos, em que uma subida repentina de 2ºC/3ºC causou uma subida de 6 a 9 metros em 200/300 anos, em alguns períodos com taxas de um metro a cada 30 anos. Mas nessa altura o homem não vivia junto à costa, tinha medo. O homem moderno não tem memória colectiva do que é o nível do mar subir um centímetro por ano, dois centímetros por ano, que é o que vai acontecer. E por vezes quando se vê hoje o galgamento das ondas, associa-o simplesmente às tempestades. Quando há um temporal que traz agitação marítima, o que vamos ter é colunas de água ainda mais aumentadas. Os furacões nos EUA chegam a subir o nível do mar seis metros, cá a sub-elevação do mar numa tempestade é de 60, 70 cm. Se a 29 de Setembro tivermos uma tempestade que faça subir o nível do mar em Cascais em 60 cm, temos a maré em Cascais a 2,60 m - aí o Cais Sodré é inundado, o Seixal é inundado. Isto não é alarmismo, é dizer o que pode acontecer. A probabilidade é baixa, mas pode acontecer. É isto que significa fazer análise de risco. Preparo-me para o mais provável mas também tenho de estar preparado para o extremo. Quando alerto para o problema das zonas de águas interiores é porque é lá que estão a maioria dos residentes e dos edifícios. Cada município terá de analisar com os diferentes intervenientes, instituições, investidores. O custo tem de ser partilhado por todos, o Estado não vai ter capacidade.
E pensando nas próximas gerações...
Sim. Veja o exemplo de Lisboa. A CUF está a fazer um hospital em Alcântara. Podem dizer que daqui a 30, 40 anos, até tiram dali o hospital porque a tecnologia fica obsoleta, mas são um investidor privado, têm outra facilidade em deslocar-se. Mas e se daqui a 30 ou 40 anos a CUF entrega o edifício à câmara? Ou vamos imaginar que em 2070 ou 2080 a zona da fundação Champalimaud começa a ser frequentemente inundada e a fundação deixa de ter interesse naquele edifício. O que é que se vai fazer? Quem é que fica com ele?
Não é um problema da fundação?
E se passa para o Estado, que solução se dá? Dentro das câmaras tem de haver técnicos responsáveis e políticos conscientes destes problemas.
Depois de 2100, o mar continua a subir?
É o efeito do aquecimento global que se vai prolongar mais no tempo, pode continuar a subir daqui a 1000 anos.
Nesse cenário o país perde território?
Não... Tenho algumas simulações que vão até 2300, 2400 e dão três a quatro metros. As reservas de água doce na Gronelândia são suficientes para fazer subir o nível médio do mar seis metros. As reservas da Antártida, se descongelasse toda, faziam subir o nível do mar 56 metros. No conjunto temos 62 metros. É possível isto acontecer em 100 anos? Não. É possível acontecer em mil anos? Não. São precisos vários milhares de anos, chegar-se a um aquecimento de 9 ºC. Mesmo esse degelo também iria arrefecer o oceano e contrariar o aquecimento e o efeito da expansão térmica.
Explique-nos esse efeito: como é que se dá a subida do nível médio do mar?
As razões são essencialmente duas. O nível do mar sobe quando o mar aumenta de volume. Isso acontece por um lado pelo aquecimento: devido ao aquecimento global a água expande. 
As projecções apontam para mais 1ºC desde o período pré-industrial.
Sim, isso em termos globais na atmosfera. Nos oceanos estamos a falar de um aquecimento de 0,8ºC à superfície. A partir de 2005 passámos a ter outro tipo de medições e dados de satélite que permitem quantificar o aumento de massa no oceano e a perda de massa na Gronelândia e na Antártida, portanto a influência do degelo.
Que tem vindo a acelerar.
Sim, são os sistemas que sentem o impacto do aquecimento mais rapidamente. O Ártico está a aquecer duas a três vezes mais rápido do que a média global. Enquanto que a média anda em 1,1ºC desde os finais do século XXI, com a Europa e os EUA a aquecerem 1,6ºC, o Ártico aqueceu 2ºC a 3ºC em algumas zonas. Um aquecimento mais rápido faz com que a diferença de temperatura entre o Ártico e as latitudes mais baixas fique menor. E por causa disso temos alterações nas correntes de jato ou no vórtice polar.
Algo que foi associado à vaga de frio que varreu este ano os EUA.
O vórtice polar está em relaxamento. É como nos rios, quando vagueiam mais devagar, começam a criar meandros. O vórtice começa a fazer trocas de ar do Ártico para zonas de latitude mais baixa, o que pode trazer períodos de ventos gelados e as pessoas pensam que afinal não estamos a aquecer mas a arrefecer. E da mesma forma vão grandes quantidades de massa de ar quente para o Ártico, o que leva ao degelo. 
Há 10, 20 anos imaginavam-se alterações com esta magnitude?
Olhando para o que os cientistas escreviam nos anos 80, vemos que não. Todos os anos há cientistas que vão à Antártida e todos os anos o reporte é idêntico: ficam chocados porque não imaginavam o quão rápido determinados sistemas se estão a desintegrar, a taxa com que os glaciares estão a correr para o oceano.
Já lá foi?
Não... Se estamos preocupados com estas coisas, viajar tem um alto impacto ambiental. Fazer uma viagem de avião pode equivaler às minhas emissões de três ou quatro meses.
Evita mesmo?
Tenho esse princípio. Já tive mais vontade de viajar, hoje acho que é mais importante ter esta consciência. Para compreender melhor o processo que está por detrás da subida do nível médio do mar há que estudar muitas coisas e acabei por dedicar-me a esta área. 
Sentiu que precisava da “big picture”?
Sim, e também de relacionar economia e crescimento económico com aquecimento global. Já fiz duas conferências aqui na faculdade sobre isso e é uma área em que estou a trabalhar.
Há más notícias?
Fazer previsões nesta área é extremamente complicado, falamos sempre de probabilidades. Os cálculos e análises permitem formular projecções. Basicamente conseguimos relacionar o aquecimento global com indicadores socioeconómicos. Se soubermos a população mundial, quanto gasta em média, quanto carbono se emite por cada dólar que gastamos, conseguimos saber as emissões anuais e projectar para o futuro. Demonstra-se por seis ou sete razões que é impossível conter o aquecimento a 1,5ºC.
No final do ano passado o IPCC avisou que temos 12 anos, até 2030, para evitar ultrapassar esse valor.
Não concordo. O IPCC é também político. Foi constituído em 1988 pela Organização Mundial de Meteorologia e pelo programa de ambiente das Nações Unidas. Foi há 30 anos. Nestes 30 anos realizaram-se 23 conferências das partes (COPs), cinco relatórios de avaliação e 15 relatórios especiais. O que é que aconteceu nestes 30 anos? As emissões aumentaram 73%, a concentração de carbono aumentou para uma média de 410 partes por milhão, 40% do aquecimento global deu-se após 1988. O nível do mar subiu 9 centímetros, quase metade da subida registada desde o século passado. A população aumentou 50%, o PIB mundial bruto aumentou 324%, o consumo de petróleo 51%. A conclusão que tiro é que o clima não responde à vontade política. Posso decidir, impor as medidas que quiser, que dificilmente vou conseguir combater o aquecimento desta forma. 
Mesmo que agora se reduzissem as emissões? 
A Europa conteve o aumento das emissões desde os anos 90, os EUA também. 
Mas aumentaram bastante na China ou na Índia.
Sim, o aumento da população e do consumo primário de energia acontece nesses países. O clima não responde à vontade política, responde ao desenvolvimento tecnológico e ao aumento da população. O cenário mais provável nos modelos que tenho estado a desenvolver é um aquecimento de 3,3ºC até ao final do século. Se conseguíssemos estabilizar agora a concentração de CO2 nas 410 partes por milhão, devido à inércia do sistema, daqui a 10/15 anos o clima aquecia até 1,5ºC e estabilizava.
Não era essa meta no final do século?
Os cenários com maior esforço de mitigação atingem 1,6ºC, 1,7ºC em 2060, 2070 e começa a cair. O objectivo é chegar ao final do século com menos de 1,5ºC, mas vamos atingi-lo mais cedo. O que me dizem os modelos é que há uma probabilidade de 3,4% de ficar abaixo de 1,5ºC no final de 2100, há uma probabilidade de 11% de ficar abaixo de 2ºC e a probabilidade de 50% é de 3,3ºC.
Está entre os pessimistas?
Considero-me mais realista do que pessimista. Todos os anos somos bombardeados com a notícia do dia em que se esgotaram os recursos. A alta tecnologia, coisa que é pouco falada nomeadamente pelos ambientalistas que defendem a electrificação e a descarbonização por via tecnológica, é altamente dependente de um conjunto de minerais a que se chama terras raras. Cada telemóvel tem 50 a 70 terras caras, o cobalto, o lítio. Se se estiver a dar uma solução para o problema das emissões que a longo prazo é insustentável, porque deixo de ter cobalto, para onde vamos? Como é que vou continuar a minha descarbonização baseada em algo que não existe? 
A indústria dos carros eléctricos não está a antecipar esse problema?
Há quem esteja e quem não esteja. O Carlos Tavares da PSA já pôs o dedo na ferida [questionou a pegada ambiental das baterias e a viabilidade desta alternativa]. A indústria está preocupada, há limitações físicas. Um ambientalista quando diz que um carro eléctrico tem zero emissões está a mentir. Feitas as contas, se fomos calcular desde o poço até à roda, como dizem os ingleses “well-to-wheel”, a diferença não é assim tanta. Tendo em conta os valores de emissões de energia em Portugal, um carro eléctrico como o Zoe pode emitir 28 gramas de CO2 por quilómetro. Um Clio a diesel, mais recente, emite 106 gramas. Se formos contabilizar o tempo de vida de uma bateria eléctrica e se pegar na intensidade de carbono - quanto carbono emito por cada dólar, que actualmente em termos mundiais é de 455 gramas/dólar -, posso calcular as emissões associadas a uma bateria. Dez anos com 15 mil quilómetros/ano dá um cálculo de 131 gramas por quilómetro no Zoe ao longo dos seus dez anos de vida. No carro de combustão também há que ser verdadeiro, porque fazem-se manutenções, pode gastar-se 600 euros por ano e há que contabilizar isso. Mas um Clio pode andar 20 anos. No final, a diferença é mínima - 131 g/km no Zoe e 142 g/km no Clio. A mobilidade eléctrica individual não é solução. Além disso temos 5 milhões de veículos ligeiros eléctricos, mais de 1,2 mil milhões a combustão. Precisava de crescer todos os anos 50%, não há terras raras. 
Não é preciso começar por algum lado? 
Na perspectiva de quem acha que é possível continuar com crescimento económico e populacional e através da tecnologia mitigar as alterações climáticas, faz sentido. Para quem não acredita, não faz sentido. Antes da revolução industrial existiam 280 partes por milhão de carbono na atmosfera. Actualmente existem 410. Aumentaram 130 partes por milhão. Existe um parâmetro que é a sensibilidade climática, que é quanto o planeta aquece por cada duplicação da concentração de CO2. É de 3ºC, ou seja, se atingirmos as 560 partes por milhão, vamos aquecer 3ºC. Se já aumentaram 130º, teremos um aquecimento de 1,4ºC. Porque é que ainda não chegámos lá? Porque a Terra tem inércia. Quando começamos a aquecer uma panela não fica logo a 100ºC.
É por isso que diz que é impossível conter o aquecimento a 1,5ºC? 
Este aumento de 130 partes por milhão vai-nos garantir nos próximos anos um aquecimento de 1,4ºC, mesmo que não emitíssemos mais nada. Em termos de emissões de energias fósseis são 36 gigatoneladas/ano e depois ainda há as emissões do uso do solo e dos incêndios. O oceano absorve 24%, a vegetação outros 24% e 50% ficam na atmosfera, são 18 gigatoneladas. Atingir a neutralidade carbónica seria reduzir estes 50%. Portanto se viajássemos metade, comêssemos metade, consumíssemos metade. Mas isso implicaria decrescimento económico, que os políticos querem a todo o custo evitar. A minha convicção, tal como diz Jared Diamond em Colapso, é que se não fizermos um decrescimento controlado, o sistema implode. Em termos sociais, provavelmente temos ter de decair, a prosperidade que temos hoje nos países desenvolvidos pode ter um fim. É preciso um novo paradigma, tem de haver uma economia circular. Se a população continuar a crescer e a ter cada vez mais prosperidade, vai ter de consumir mais energia.
E se forem energias limpas?
Como é que fundimos a sílica a 1800 ºC para produzir painéis solares sem carvão e sem gás natural? A energia solar não fornece energia suficiente para fornos de alta temperatura. Como é que vou fundir o aço para fazer eólicas? Onde é que tenho magnésio, lítio, cobalto se o esgotar todo? As projecções da ONU apontam para uma população de 11 mil milhões em 2100, 9 mil milhões em 2050. Vemos que a população cresce em média 0,5% ao ano. Se aumentarmos o rendimento per capita em 1%, juntando a esse efeito o aumento da população, teríamos de suprimir emissões num nível superior. Olhando para os dados históricos, nunca desde que há registo se diminuíram as emissões. O melhor que conseguimos é uma estagnação. E se formos verificar esses períodos coincidem com crises económicas. Tenho a convicção de que sem decrescimento económico não é possível, não é sustentável.
Mas como, quando é preciso crescer para haver por exemplo mais investimento público?
Não sei, mas vai ter de ser viver com menos. Um dos exemplos que a ONU dá é a quantidade de recursos que consumimos, nove toneladas por ano por pessoa, 25 kg por dia. Se compararmos um indiano com um americano, o americano consome 40 kg, do interruptor da casa ao asfalto das estradas que usa, o indiano consome apenas quatro. Sem pensar em decrescer, se tentarmos pelo menos igualar o consumo, os países mais ricos teriam de baixar o seu nível de vida. Se a população continuar a aumentar, sem decrescimento de consumo de recursos naturais, teremos um cenário de colapso. O combate às alterações climáticas é paradoxal. O desenvolvimento tecnológico precisa de crescimento económico. Se cresço, aumento o consumo de energia primária. Como o peso das energias fósseis é grande, o esforço de mitigação tem de ser cada vez maior.
Além das viagens de avião, de que é que abdica no seu dia-a-dia?
Uma pessoa quando pensa nestas coisas fica com dilemas, às vezes nem dormimos. É tentar ser um bocado coerente. Este telemóvel tem 13 anos e recuso-me a comprar um telemóvel desses (smartphone), porque sei o que custa em termos ambientais. Esses telemóveis duram actualmente nos EUA 18 meses, aqui na Europa são dois anos, dois anos e meio. As pessoas são obrigadas a mudar de telemóvel ou porque se tornou obsoleto, intencionalmente por parte de quem os fabrica, ou porque deixou de estar na moda. Se prolongar o tempo de vida daquilo que utilizo, que é o princípio da economia circular, vou precisar de menos recursos. O que faço é isto, tentar ser o mínimo consumista.
Mas em 2006 já tinha essa perspectiva?
Não, longe disso. Comecei a tê-la quando comecei a estudar, a ler. Uma pessoa começa a aperceber-se de que a humanidade está a caminhar para uma situação insustentável. Os mais ricos não abdicam do nível de vida que têm. E os países em desenvolvimento, que são actualmente 5,5 mil milhões de pessoas, têm legítimas expectativas de ter esse mesmo estilo de vida. Os chineses consumiam em 2010 12 kg de carne de vaca por ano, os europeus cerca de 30 quilos, os americanos 40. A previsão é que os chineses para o ano consumam já 20 kg. Se já estamos com um problema de escassez de recursos, imagine 11 mil milhões a consumir assim.
Têm de ser os países ricos a cortar o consumo.
As pessoas com menos recursos têm todo o direito a evoluir. E temos um histórico que nos dá uma responsabilidade acrescida. Quando se diz que a China é o maior emissor, é o maior emissor em termos absolutos anuais. Se dividir isso per capita, os chineses emitem 5 tonelada/ano e os americanos 12 toneladas por ano.
E nós?
À volta de 4,8, na média mundial. 
Come carne?
Estou a reduzir carnes vermelhas.
Faz sentido deixar de comer carne por motivos ambientais?
A área necessária para produzir cereais para alimentar o gado dava para produzir muito mais produtos vegetais. A energia gasta para produzir um quilo de carne de vaca dava para 18 quilos de pão. Agora isto depende da métrica que se faça. Diz-se que 17% a 30% dos alimentos são desperdiçados. Se conseguirmos minimizar isso a zero, a pressão é menor. As estatísticas também dizem que em média ingerimos mais do que as calorias necessárias. O homem moderno precisa de 1800, em média consomem-se 2600. Se reduzíssemos àquilo que necessitamos e evitássemos o desperdício, provavelmente não estaríamos numa situação de ter de deixar de comer carne.
Mas essas escolhas individuais que faz têm algum impacto?
É a questão se pode colocar para tudo. Quando o ministro do Ambiente diz que é possível Portugal chegar à neutralidade carbónica em 2050, sim, é interessante, mas Portugal contribui com menos de 0,1% do aquecimento global. Mas Portugal deve fazê-lo, porque 26 países como Portugal vão contribuir o mesmo que os 0,26% da Índia, ou 67 países iguais a Portugal vão contribuir o mesmo que os EUA, ou 123 países iguais a Portugal vão contribuir o mesmo que a China. O nosso contributo é pequeno, mas temos todos de participar. 
Acha que o movimento iniciado por Greta Thunberg veio mudar alguma coisa?
Sim e não. Noutro dia numa apresentação pública de um relatório da APA um engenheiro dizia “estamos a brincar”. Esta é a perceção que tenho. Se quisermos a sério temos de reduzir o consumo. 
Ela dá esse exemplo, anda de comboio. 
Sim. Tem uma argumentação sólida, fluente, fácil de captar e essa coerência. 

Mar: "Estamos a esgotar os Oceanos sem antes os conhecermos"


A 25 de maio chegou o alerta: “Se todos os países do mundo consumissem como Portugal, o cartão de crédito ambiental teria de ser accionado”. Ou seja, nesse sábado primaveril, Portugal já havia gasto todos os recursos disponíveis para o presente ano. Contas feitas, 21 dias mais cedo face a 2018.
Um alerta deixado pela Zero, associação ambientalista, que Luís Rodrigues, Director Regional das Pescas dos Açores, recordou na abertura do simpósio que decorre em Lisboa a 27 e 28 de maio, o “Sangue na Guelra”. Na sua intervenção, este responsável trouxe um olhar “sobre o maior território marítimo da Europa, os Açores” e ilustrou-o trazendo aos presentes no simpósio uma imagem com uma espécie destas águas atlânticas, “o Atum Rabilho. Uma das espécies mais emblemáticas da região. Constatámos que, a cada ano, se estava a pescar metade daquilo que se capturava no ano anterior. Acresce que 85% das embarcações de pesca açorianas são licenciadas para a pesca do atum. Menos pesca traz um enorme impacto nas famílias”, sublinhou Luis Rodrigues, recordando o efeito de escala: “Temos três fábricas que ocupam 900 pessoas”. Havia que descobrir as razões para esta quebra do recurso marinho. E, aqui, a narrativa entronca na questão da sobrepesca.
“Nos últimos anos entraram cerca de 500 operadores da pesca do cerco no Atlântico. Nos Açores, a pesca do atum faz-se com salto e vara”. Em suma, como sublinhou o Director Geral, “num só lance de pesca do cerco podem vir à rede 300 toneladas de atum, tanto quanto os Açores capturam num ano com o método tradicional. Tínhamos de dar o alerta. Há que recordar que falamos de uma espécie migratória, não é um recurso existente todo o ano nas águas nacionais”.
“Fizemos um memorando em diferentes línguas e no encontro anual da entidade que faz a gestão internacional do atum estive presente. São reuniões intensas, com mais de 50 países à volta de uma mesa, todos eles defendendo uma cota. Quando, finalmente, consegui chegar ao debate, descobri que a mesma pessoa que representava a pesca de lance nos Açores era a que representava o cerco. Fiz, então, lobby com organizações ambientais. Tivemos um encontro internacional de pesca de salto e vara [Conferência Internacional sobre Pesca de Atum de Salto e Vara, decorrido em 2017]”.
Um episódio que deu a Luís Rodrigues pretexto para trazer ao auditório reunido em Lisboa, um retrato sobre os “oceanos, o maior reservatório de água do planeta. Devemos pensar no ciclo da água. A que temos dentro da garrafa que seguramos na mão esteve no oceano. Este dá-nos oxigénio, o oceano purifica o ar. É, também, a fonte de proteína selvagem. Oitenta por cento das espécies do planeta vivem neste habitat. Conhecemos apenas 10% deste meio. Estamos a esgotar os oceanos sem antes os conhecermos”.
“A cada dez anos, a política para a pesca altera-se. Uma parte das regras chega-nos de Bruxelas. Porque alteramos a política a cada década? Porque há nova tecnologia, novos pescadores, novos barcos”, substancia Luís Rodrigues para, depois responsabilizar todos os cidadãos: “A cada década, todos nós somos convidados a participar na construção dessas regras. A ferramenta que agiliza o processo de discussão chama-se ´Livro Verde da Reforma da Política Comum das Pescas`. No último livro era referido que 90% dos recursos marinhos estão sobrexplorados. Repare-se, um quarto do que se pesca na Europa é para fazer farinha para alimentar animais domésticos. Um quinto do que se pesca no Velho Continente é acidental e rejeitado. Trinta porcento dos ecossistemas marinhos na Europa estão colapsados, não voltarão a ser o que eram”.
Para o orador, “temos, enquanto consumidores, de garantir a mudança. Variar as espécies de peixe consumidas. A maioria das pessoas consome as mesmas quatro ou cinco espécies marinhas”.
“Em 2001 discutia-se a política de pescas e corríamos o risco de perder uma parte do território marítimo português, passando para a gestão de Bruxelas. Eu não via essa discussão pública acontecer. Quisemos levar a questão à Assembleia da República. Tínhamos de reunir 75 mil assinaturas. As pessoas não compreendiam a real dimensão do que estava a acontecer. Na Universidade, pedi aos meus alunos que desenhassem Portugal. Desenhavam terra, mas esqueciam-se de toda a Zona Económica Exclusiva Nacional. Ou seja, nós não incorporámos o mar no nosso imaginário como um território que é nosso”.
Luís Rodrigues desmistificou o mar dos Açores: “Ao contrário do que se imagina, nós temos muito pouco peixe. Porquê? Porque a maior parte do peixe precisa de um fundo com luz. Nós, nos Açores, temos um mar abissal, com mais de três mil metros de profundidade. Pescamos na orla das ilhas e locais que já foram ilhas, erodiram-se, tornando-se bancos de pesca”.

quinta-feira, 23 de maio de 2019

Cientistas descobrem um gigante aterro de lixo no Mar Mediterrâneo


Bonecas, pedaços de sanitas, móveis, barcos, colchões, mesas, árvores de Natal, roupas, pneus, tijolos, tapetes e até um carro inteiro. E plástico, muito plástico. As imagens obtidas por um robot de exploração submarina revelaram um verdadeiro aterro subaquático onde se pode encontrar quase todo o tipo de lixo, em pleno Mar Mediterrâneo. E as consequências ambientais são imprevisíveis, porém garantidas.
“Parece uma sequência de um filme pós-apocalíptico, mas na realidade é o fundo do Mediterrâneo”, escreve o “El País” num artigo desta terça-feira, 21 de maio.
Numa extensa reportagem, o jornal espanhol cita um estudo do Conselho Nacional de Pesquisa da Itália (CNR) e da Universidade de Roma La Sapienza, que foi disponibilizado nos “Scientific Reports” da plataforma “Nature” no final do mês de março.

De acordo com o “El País“, uma equipa de investigadores encontrou em Itália a maior concentração de lixo já registado em águas profundas em qualquer lugar no mundo. O depósito está no Estreito de Messina, que separa a ilha da Sicília da região da Calábria e a concentração de resíduos é “surpreendente”.
O robot submersível POLLUX III foi registando em imagens o que encontrava e percebeu-se que, quanto maior a profundidade, mais desperdício havia. E a situação é mais preocupante porque ele tinha um limite de descida até aos 600 metros, suspeitando os cientistas de que se tivesse ido mais fundo teria encontrado mais lixo.
Quanto aos resíduos encontrados, o maior foi o plástico, seguido de material de construção, vestuário e metal.

Os cientistas relatam que viram ouriços-do-mar e os peixes a usar o lixo como refúgio e alertam para um tipo de contaminação pouco estudada.
A equipa vai agora analisar o impacto que estes desperdícios podem ter sobre a vida selvagem. “O plástico pode durar até 500 anos no mar e é uma fonte de poluentes orgânicos persistentes que são tóxicos para a fauna marinha e que podem acumular-se nos seus tecidos”, explicam.
Quanto às causas, a má gestão de resíduos na Sicília e na Calábria pode explicar grande parte do problema, mas o Mediterrâneo é também conhecido como um mar predisposto a acumular resíduos, por criar uma bacia quase fechada. E por ter grandes cidades à volta e uma troca limitada de águas.
Em 2017, a Organização Não Governamental WWF já tinha publicado um relatório alarmante sobre o aumento da poluição no Mar Mediterrâneo devido ao turismo em massa e à exploração dos recursos marinhos. A WWF explicou então que as espécies marinhas viram as suas populações diminuírem, com 41 por cento menos mamíferos marinhos e 34 por cento menos peixes do que há 50 anos. Em termos de flora, as ervas marinhas sofreram 34 por cento de degradação no mesmo período de tempo e os corais estão ameaçados de extinção. 

Portos com um mês de Janeiro "pujante" e positivo.

A AMT - Autoridade da Mobilidade e dos Transportes, no seu relatório, indica que os portos nacionais iniciaram 2024 de forma positiva, tendo...